Concluída a eleição e com menos de 60 dias para os recessos no Legislativo e no Judiciário, a campanha pela aprovação dos projetos que revisam os planos de cargos e afastam o congelamento salarial terá que correr contra o tempo e a ameaça de um possível ‘ajuste fiscal’.
Dirigentes da federação nacional (Fenajufe) informam que vão buscar contatos com a direção do Supremo Tribunal Federal para solicitar que, conforme prometido, o ministro Cezar Peluso procure o presidente Lula para tratar da tramitação dos projetos que contemplam os servidores do Judiciário Federal e do Ministério Público da União.
Vão enfrentar uma ‘agenda cheia’ em Brasília, que estará voltada para as articulações políticas relacionadas à composição do governo de Dilma Rousseff, que terá que contemplar com cargos dez partidos da coligação. Terá, ainda, que administrar a voracidade do PMDB, maior partido aliado e dono da vice-presidência, do próprio PT e a ascensão eleitoral do PSB, legenda que mais cresceu dentre as que compõem a base de apoio do governo Lula.
Discurso de conter gastos agrada ‘mercado’
A candidata eleita, Dilma Rousseff, procurou negar durante a campanha que planeje fazer um ajuste fiscal aos moldes do promovido por Lula em 2003, assim que assumiu pela primeira vez a Presidência da República. Mas não nega que agirá para que a chamada meta de superávit fiscal primário – economia de dinheiro para pagar juros das dívidas públicas – seja atingida.
O funcionalismo aparece nas notas nos jornais, com freqüência, como um dos principais alvos a ser atingido. No sábado (30), véspera da eleição, a coluna “Panorama Político”, do jornal carioca “O Globo”, informava que já existiria um suposto acordo entre lideranças do PT e do PMDB com o objetivo de evitar que projetos que representem aumentos de despesas sejam aprovados.
Já o jornal “Folha de São Paulo” publicou, na edição de terça-feira (2), que o presidente Lula poderá tomar medidas impopulares para poupar a sua afilhada política de fazê-lo no início de seu governo. Dentre estas medidas, estaria o veto ao PL 6613/2009, que revisa o plano de cargos e salários dos servidores do Judiciário Federal. O jornal fala numa possível redução orçamentária da proposta até o valor que represente a reposição da “inflação do período”. Em entrevista no mesmo dia, à noite, ao “Jornal do SBT”, Dilma negou que haja qualquer articulação para que Lula antecipe medidas duras, mas disse que algumas questões, como o índice de reajuste do salário mínimo, serão negociadas.
O jornal “Valor Econômico”, da segunda-feira (1º), também destaca que a busca da meta fiscal deve levar o governo a acelerar a aprovação do PLP 549/2009, projeto que se encontra na Comissão de Finanças da Câmara e que, se aprovado, na prática congelará os salários dos servidores públicos federais por dez anos. Na avaliação do economista Washington Lima, que assessora sindicatos do Judiciário Federal, ao estabelecer novos limites orçamentários para o aumento de despesas com a folha de pagamento em órgãos públicos, o projeto inviabilizaria o PCS-4.
O PLP 549 encontra-se na mesma comissão na Câmara em que se encontram as propostas de reajustes do Judiciário e do Ministério Público da União. No entanto, está mais adiantado, pois já passou pelo Senado. “O governo pode aprovar [o PLP 549] em um dia”, disse, durante a mais recente reunião nacional da categoria, o servidor Pedro Aparecido, dirigente da federação nacional (Fenajufe) e do sindicato de Mato Grosso (Sindijufe-MT). Ele alertava para a necessidade de os servidores voltarem a se mobilizar o quanto antes para enfrentar o congelamento salarial e exigir a aprovação dos projetos que atendem à categoria.
Equipe de transição vai tratar de orçamento
É praticamente certo que as questões que envolvem aspectos orçamentários de peso vão passar pela equipe de transição de governo. Oficialmente, a presidenta eleita já indicou quatro nomes para compor a equipe pelo futuro governo. São eles: Michel Temer, pelo PMDB; e José Eduardo Dutra, Antonio Pallocci e José Eduardo Cardozo, pelo PT. Pelo atual governo, fala-se no nome de Paulo Bernardo (Planejamento) para comandar as negociações – Bernardo foi quem, logo após o fim da greve deste ano, ficou incumbido por Lula de dizer aos representantes dos servidores que as discussões sobre o PCS teriam que esperar o próximo presidente eleito. A equipe de transição é uma instância formal e oficial de governo e terá um orçamento de R$ 2,8 milhões para o seu funcionamento.
Dentre os assuntos que irá tratar, estará o relatório a ser votado para Lei de Orçamento Anual (LOA) de 2011. Hoje, o projeto não prevê recursos para o PCS. Para isso mudar, basta o presidente Lula enviar uma alteração à proposta, antes da votação do relatório preliminar, o que está previsto para ocorrer até 16 de novembro. Ou, ainda, que o relator da LOA, senador Gim Argello (PTB-DF), inclua a previsão em seu parecer, previsto para ser apresentado até o dia 5. Estas datas, no entanto, podem ser alteradas, o que é bem provável que aconteça, já que o Congresso Nacional estava parado, por conta do processo eleitoral, e em decorrência das próprias negociações que vão acontecer na equipe de transição de governo.
Um dos integrantes desta equipe, o deputado federal José Eduardo Cardozo (PT-SP), esteve reunido com dirigentes da Fenajufe e do sindicato de São Paulo (Sintrajud) antes do segundo turno da eleição. Recebeu dos trabalhadores documentos que reivindicavam uma posição favorável da candidata aos projetos que revisam os planos de cargos e salários e contrária ao congelamento salarial. Ficou de levá-los a Dilma e retornar com uma resposta. Não retornou. “Ele se disse sensível à proposta, mas não assumiu nenhum compromisso”, relata Antonio Melquíades, o Melqui, diretor da Fenajufe e do Sintrajud e um dos servidores que participaram da reunião com Cardozo. O deputado petista, aliás, está cotado para assumir o ministério da Justiça, embora seu nome já tenha sido ventilado como uma possível indicação à vaga de Eros Grau no Supremo Tribunal Federal.
Estados debatem mobilização
É diante desse cenário incerto, com prazos cada vez mais curtos e movidos a intensas movimentações políticas, que os servidores do Judiciário Federal e do MPU preparam a retomada das mobilizações. O calendário aprovado na reunião ampliada prevê uma paralisação de 24 horas no dia 11 de novembro e, seis dias depois, o início da greve por tempo indeterminado a partir de 17 de novembro. É para esta data que está marcada uma audiência com o presidente do STF, Cezar Peluso. A reunião está até o momento mantida, mas a audiência anterior, que aconteceria em outubro, acabou desmarcada na véspera. Os servidores esperam não só que a história não se repita como querem a antecipação da data. “Vamos tentar ser recebidos por Peluso antes disso”, disse Melqui. O objetivo é pressionar para que a autoridade máxima do Poder Judiciário use sua prerrogativa constitucional, procure Lula e exija do presidente a inclusão do PCS no orçamento.
Até aqui isso não aconteceu. Mas, durante os meses de greve no primeiro semestre desse ano, Peluso sustentou que o acordo com Lula prevê solucionar isso logo após as eleições. Não esmiuçou, porém, porque não quis ou porque não existem, quais seriam as bases dessa solução. Disse, é verdade, que continua defendendo o PCS-4 com o teor com que se encontra na Câmara. Mas nada fez quando Lula vetou seu pedido de inclusão de previsão orçamentária para o projeto dos servidores e acatou apenas o dos magistrados. “Não temos nenhuma confiança no Peluso, que vem ajudando o governo a congelar os salários”, ressaltou, também durante a reunião ampliada da Fenajufe, a servidora Ana Luiza Figueiredo Gomes, diretora da federação. “Temos que pressionar o presidente do STF, o Peluso é o principal responsável [pela não aprovação do projeto]”, reforçou Rosicler Bonato, servidora da Justiça do Trabalho do Paraná que integrava a delegação do Sinjutra à plenária.
É hora de cobrar de Peluso e de Lula o prometido. A construção da mobilização, que está sendo debatida nas assembleias nos estados, é parte dessa disputa, na qual, como se vê, os servidores só podem contar com a força que alcançam quando se unem. Todos sabem que não será fácil. Mas, na definição do orçamento, quem ficar calado está fora da disputa.
Por Hélcio Duarte Filho, jornalista do LutaFenajufe