A realização de uma Conferência Nacional de Comunicação no Brasil tem sido reivindicada por vários setores da sociedade. Depois de muita pressão, o governo Lula finalmente convocou a conferência, que ocorre de 1º a 3/12. Com o objetivo de debater o tema e formular estratégias de participação no evento nacional, as CUTs da Região Sul reuniram, de 13 a 15 deste mês, na Escola Sul, em Santa Catarina, sindicalistas do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina e Paraná. Pelo Sintrajufe, participaram a diretora Cristina Lemos e a assessora Rosane Vargas.
O professor da Escola de Comunicação e Artes da USP e ex-assessor especial da Presidência da República, Bernardo Kucinski, foi o primeiro a falar na mesa-redonda Construindo um Sistema Público de Comunicação – O Papel das Políticas Públicas. Ele começou criticando o atual modelo. “Temos uma mídia concentrada, oligárquica; no limite, golpista”, e que representa um risco à democracia, afirmou. A grande mídia, segundo o professor, “tem mais unidade ideológica do que qualquer partido político na defesa de seus interesses”.
Sobre o governo Lula, o qual assessorou, Kucinski foi duro. “O governo fez um pacto com os banqueiros e um pacto com a Globo.” Na opinião dele, o governo chamou a Conferência de Comunicação em contraponto, porque a Globo não moderou os ataques. Para o ex-assessor, o governo se propõe a fazer mudanças somente até onde não confronte os setores mais fortes, como banqueiros e proprietários de terras e dos veículos de comunicação.
A TV pública, disse, foi criada quando o governo sentiu, na crise do mensalão, o perigo de um golpe midiático. Nesse processo, segundo Kucinski, o governo cometeu um erro grave: acabou com o sistema estatal e colocou na nova TV quadros do sistema dominante, funcionários das grandes empresas.
O professor finalizou dizendo que o Estado é um espaço de disputa. Se não houver mobilização, tudo fica como está. Por isso ele insistiu que é preciso fazer cobranças objetivas. Temos que “pensar forte e pra frente, sempre pra frente, e pensar claro”. Isso significa saber de quem cobrar e o que cobrar. Na opinião do painelista, o endereço da cobrança é o governo Lula. Deve-se cobrar o cumprimento da lei, que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica [Cade] enfrente os monopólios; a utilização do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações [Fust] em programa de inclusão/educação digital; a revisão das concessões de TV; o fim da perseguição às rádios comunitárias; a elaboração de uma política de propaganda do governo que considere a diversidade; o apoio ao sistema público de comunicação; a recomposição do sistema estatal de comunicação; a proposta de uma nova lei de imprensa.
Conquista da luta
O professor e dirigente da Federação Nacional dos Jornalistas [Fenaj] José Torves começou rebatendo o painelista anterior. Para ele, o governo convocou a Conferência de Comunicação porque foi pressionado pelo movimento social, que há anos discute a comunicação no país. Ele concordou com Kucinski quanto ao papel da grande mídia: “A RBS é o maior partido político do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina”. Para Torves, é preciso diferenciar as TVs privada e pública. A primeira seria feita para consumidores; a segunda, para cidadãos.
O Brasil não tem uma história de sistema público de TV. “Não temos experiência, e a TV pública acabou ficando com características de TV estatal”, disse Torves. Na opinião de Torves, é possível evoluir e a Conferência de Comunicação pode ser o espaço para isso. “Temos que nos preparar para trazer a discussão ideológica, não só produzir, mas discutir a produção. O que está em jogo é a disputa com o capital”, disse o jornalista.
Para Torves, muito seria resolvido com a regulamentação do capítulo da Constituição que proíbe deputados e senadores de possuir rádios e TVs. Como a votação é feita pelos próprios congressistas, quem acredita que eles tenham interesse em que ela aconteça?
As rádios comunitárias também entrariam nesta discussão. Torves sugeriu que se leve à Conferência a sugestão de que uma parte do Fust financie esse sistema. Ele lembrou que 55% das verbas públicas vão para os grandes veículos por falta de uma política pública para o setor.