César Rodolfo Sasso Lignelli, advogado do Sintrajud-SP, do Sindsep-SP e do Sindicato dos Metroviários de São Paulo; e Washington Lima (economista), assessor econômico do Sintrajud/SP e outras entidades. Esses foram os dois palestrantes que abordaram o tema “Impactos e consequências diretas nos tribunais (TRT, TRE, JF JM) decorrentes da reestruturação do Estado”, no prosseguimento do Seminário “Reestruturação do Estado Brasileiro e seus impactos no Judiciário Federal”, evento do SITRAEMG que se realizou neste sábado (19/10), no Hotel Normandy, em Belo Horizonte. Além dos palestrantes, compuseram a mesa o coordenador Paulo José da Silva, a conselheira fiscal Paula Meniconi e os filiados Adriana Araújo e Marcos Vinícius Félix.
Na avaliação de César Lignelli, o Brasil teve um crescimento econômico até o ano de 1983 e tinha tudo para alavancar o seu “estado de bem-estar social”. O que impediu essa evolução foi a alta concentração de renda, que ficou ainda mais patente logo depois de entrar em vigor a Constituição Federal de 1988, cuja finalidade seria a implantação desse estado de bem-estar social, mas esse objetivo foi ficando distante com a adoção, no país, das determinações do documento 319 do Banco Mundial (estipulava mudanças do funcionamento do judiciário brasileiro para oferecer segurança jurídica às empresas transnacionais que quisessem investir sem riscos no país) e do Consenso de Washington (decisão tomada, em consenso, por instituições financeiras norte-americanas, Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e Departamento do Tesouro dos Estados Unidos com a estipulação de medidas, pelos governos de países subdesenvolvidos, sobretudo da América Latina, de redução de gastos, enxugamento do Estado, desregulamentação da economia e outras, mais uma vez para facilitar o investimento seguro das empresas estrangeiras).
Seguindo essas diretrizes, já no governo Fernando Henrique foram tomadas medidas drásticas de redução do Estado, como a retirada de 80 direitos dos servidores, a primeira das várias reformas da Previdências promovidas por sucessivos governos e uma grande reforma administrativa. Com isso, o Brasil, que caminhava para a industrialização, desviou-se para o caminho da “financeirização”.
Essa política de desmonte do Estado, segundo Lignelli, gerou fortes impactos para os setores público e privado. No judiciário, por exemplo, os terceirizados hoje consomem 4% do orçamento e ocupa 36% da força de trabalho. E o governo não está satisfeito. Há ainda uma grande margem para o enxugamento do setor público: 140 empresas que podem ser privatizadas, o SUS, 60 universidades federais ameaçadas de privatização e mais de 1,4 milhão de servidores correndo os riscos da redução do Estado. E esta semana foi divulgado estudo do Banco Mundial, afinado à política do atual governo, que recomenda a aplicação de ações como redução de rendimentos iniciais dos servidores, aproximação dos salários aos praticados pelo setor privado e aplicação efetiva de avaliação de desempenho para progressão de carreira – para obter uma economia de 389 bilhões até 2030. Medidas que, certamente, estarão na proposta de ampla reforma administrativa que o governo pretende apresentar nas próximas semanas ao Congresso Nacional.
Ainda se referindo ao judiciário, o palestrante destacou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que está para ser apresentada na Câmara com o objetivo de extinguir a Justiça do Trabalho, passando o que sobrar dela para o âmbito da Justiça Federal. No caso da Justiça Federal, ele chamou a atenção para um documento que está sendo elaborado para a Seção Judiciária de São Paulo e pode vir a ser o “plano piloto” a ser aplicado em todos os estados, prevendo o esvaziamento das secretarias e facilitando a substituição, aos poucos, dos servidores efetivos por terceirizados. “Resistir primeiro, e depois defender uma nova pauta”, foi a dica de mobilização deixada pelo advogado do Sintrajud-SP e outros sindicatos diante da ameaça cada vez maior de desmonte total do Estado.
Dribles no orçamento e perigos da Resolução 219 do CNJ
O economista Washington Lima confessou-se mais otimista em relação ao atual quadro político do país, apostando que muitos servidores que votaram no atual governo não votarão de novo. Reportando a um estudo elaborado por ele mesmo sobre a Emenda Constitucional 95 (congelou gastos públicos por 20 anos), que previa uma redução de 35% nos gastos, em 15 anos, ele lamenta que ela traz sérias ameaças, como perdas salariais, congelamento dos benefícios sociais, redução do quadro até de terceirizados, redução do quadro. Mesmo assim, em sua assessoria às entidades, ele tem suado a própria EC 95 como referência para apresentar argumentos que assegurem, através da legislação anterior, verbas orçamentárias disponíveis. “Nesse caso do orçamento, a gente tem que fazer uma ‘mediação’. Debater, por exemplo, que os PCSs são anteriores à PEC (apoiar nas contradições para tentar ‘explodir’ o negócio)”, reforçou.
Quanto à Justiça do Trabalho, ele informou que, ao contrário do que se esperava, que a Reforma Trabalhista esvaziaria essa especializada, de 2017 para 2018 isso realmente aconteceu, mas a situação mudou de lá para cá, com o aumento dos processos em movimentação. “As pessoas ainda não desistiram da Justiça do Trabalho”, comemorou.
Um dos calos nos pés dos servidores do Judiciário, segundo Washington Lima, é a Resolução 219, do Conselho Nacional de Justiça. Entre tantos outros males, além de causar uma confusão com o esvaziamento da primeira instância, com a transferência de servidores dessa para a segunda, cria uma situação de competição que só visa a exploração ainda maior dos servidores, trazendo como “prêmio” a redução do quadro.
Debate
Passando para o debate, o coordenador do SITRAEMG Paulo José da Silva reforçou a convocação dos servidores para as lutas, lembrando que, na próxima terça-feira (23), o Sindicato estará presente no seminário de lançamento da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, na Câmara dos Deputados. “Vão tirar a nossa estabilidade. É preciso que a gente lute. Precisamos de um sindicato forte”, convocou.
Ao responder às perguntas dos participantes, o economista Washington Lima afirmou que a pior derrota dos trabalhadores é ficar no imobilismo, e defendeu a criação de estratégias para ganhar os jovens e a população para a luta. Cesar Lignelli lembrou que as relações no serviço público serão mais precárias, cargos políticos continuarão sendo nomeados, e pontuou que, para acabar com o imobilismo, os sindicatos devem ir à base de chamá-la para as lutas nas ruas.