Dando sequencia às denúncias divulgadas na edição de ontem, o “Estado de Minas” de hoje prossegue com a série de reportagens sobre o nepotismo no TRT da 3ª Região informando que o Ministério Público Federal já está apurando os casos apontados.
Vale lembrar que o nepotismo nos tribunais federais de Minas vem sendo denunciado incessantemente pelo SITRAEMG, com alguns casos já confirmados e culminados na demissão do funcionário irregular. O Sindicato continuará denunciando, até que se extinga de vez essa prática em Minas, uma vez que foi proibida em todo o serviço público no País, através da Súmula no 13 do STF.
Eis a íntegra da matéria publicada pelo ESTADO DE MINAS na edição desta quinta-feira, 19, e, na sequencia, também a publicada ontem. A séria de reportagem é assinada pelas repórteres Isabella Souto e Maria Clara Prates:
MP quer acabar com a farra dos empregos no TRT
O Ministério Público Federal quer acabar com a farra das requisições de funcionários concursados de prefeituras pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT). É o que diz parecer assinado pelo procurador regional da República, Augusto Aras, anexado a recurso que tramita no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, em Brasília. O recurso foi ajuizado pela Advocacia-geral da União (AGU) – em nome do TRT – para tentar anular decisão da 14ª Vara da Justiça Federal, em Belo Horizonte, que determinou à direção do órgão a devolução de 343 funcionários aprovados em seleção para 90 municípios mineiros e transferidos a Belo Horizonte para ocupar cargos na Justiça Trabalhista – alguns deles nos gabinetes de juízes.
“Conquanto o quadro de pessoal dos tribunais pátrios necessitem de mais servidores públicos, não se pode admitir a utilização indiscriminada da requisição para sanar tal problema, que, via de regra, há de ser solucionado por lei e por subsequente concurso público”, escreveu o procurador no parecer. O esquema armado pelo TRT para garantir contracheques mais altos para, em alguns casos, parentes de juízes, ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e diretores do órgão ofende, na avaliação de Augusto Aras, os princípios da “legalidade, isonomia, impessoalidade e moralidade”. O recurso está parado no gabinete do desembargador federal Cândido Ribeiro desde junho do ano passado.
Até que o TRF dê a palavra final sobre o assunto, o TRT mantém servidores requisitados de outras esferas do poder público em seus quadros. De acordo com nota oficial divulgada ontem pelo TRT, há atualmente 188 servidores cedidos por prefeituras para a Justiça do Trabalho, todos observando acordo firmado com o Ministério Público. Essas requisições se encaixariam nas regras acordadas com a Procuradoria Regional da República, em Belo Horizonte, por meio de um termo de ajustamento de conduta (TAC).
A norma permite a cessão de servidores públicos municipais para órgãos sediados na Região Metropolitana de BH, desde que sejam funcionários estáveis ou concursados com estágio probatório cumprido, com nível de escolaridade e cargo compatíveis com a função comissionada que vierem a exercer no tribunal. O TAC trouxe ainda cerca de 20 nomes de servidores que seriam “devolvidos” aos municípios de origem. Segundo Faleiro, antes mesmo da assinatura do TAC, parte dos 343 nomes apresentados na ação judicial não trabalhavam mais no TRT, por isso o número inferior.
LEI – A despeito da tentativa de normatizar a manobra envolvendo servidores, o TRT ainda não desistiu de convencer a Justiça de que nunca cometeu qualquer ilegalidade ou imoralidade. Na defesa feita junto ao TRF, a Advocacia-Geral da União alegou que não há qualquer ilegitimidade na requisição de servidores municipais para prestar serviços à Justiça do Trabalho de Minas Gerais, além de não existir lei que obrigue o empréstimo de funcionários apenas para a cidade onde prestou concurso.
Os convênios com os municípios, segundo o recurso, “foram celebrados para garantir a continuidade da prestação do serviço público da Justiça do Trabalho”. “Encontrando-se a requisição de servidores, excepcional e provisória, devidamente justificada, não há como se concluir pela imoralidade apontada na sentença”. Dados repassados pelo TRT informaram ainda que o número de cedidos era 237, e não os 343 apontados pelo Ministério Público Federal na ação ajuizada em 2006.
Tribunal desrespeita regimento interno
Enquanto o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) tenta mostrar à Justiça que não cometeu qualquer ilegalidade ou imoralidade ao empregar concursados do interior e parentes de juízes e desembargadores em seus quadros em Belo Horizonte – conforme o Estado de Minas revelou na edição de ontem –, o seu próprio regimento interno veda a prática. O que mostra mais uma regra desrespeitada pelo órgão que é o responsável por fiscalizar a relação entre patrões e empregados.
Publicada em setembro de 2002, a Resolução Administrativa 127 já proibia a nomeação para cargos em comissão ou designação – incluindo por meio de requisição – de cônjuges, companheiros, parentes e afins de magistrados e servidores em atividade, até o terceiro grau. A exceção caberia apenas aos servidores concursados de carreira judiciária, o que segue o artigo 10º da Lei 9.421, de 24 de dezembro de 1996, que trata das carreiras no Poder Judiciário.
A norma foi ignorada pelo TRT, de acordo com investigação do Ministério Público Federal. Em ação civil ajuizada em outubro de 2006 na 14ª Vara da Justiça Federal, foram citados expressamente 15 casos de nepotismo envolvendo familiares de juízes, ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e de diretores do TRT. Os que chamaram mais a atenção dizem respeito a dois filhos do ex-presidente do TRT Antônio Miranda de Mendonça, aprovados em concurso para serviços gerais e serviços públicos no interior do estado e transferidos para trabalhar em Belo Horizonte.
CONVÊNIOS – Também na Resolução 127 foi definido que as carências de pessoal do tribunal poderiam ser supridas por meio de convênios com órgãos públicos para a requisição de servidores – mas desde que fossem estáveis ou concursados com estágio probatório cumprido, e nível de escolaridade e cargo compatíveis com a função comissionada que exercerão no TRT. Outra norma desrespeitada, levando-se em conta que aprovados em concurso para faixineiro foram deslocados para cargos do alto escalão do tribunal.
Depois de responder na Justiça a uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal questionando os convênios com os municípios, a direção do TRT incluiu em seu regimento, em dezembro de 2006, um artigo prevendo que o servidor municipal só poderia prestar serviços em órgãos localizados no município cedente.
O desrespeito a normas internas atingiu também cargos de chefia de vários cartórios da Justiça trabalhista de 1ª instância. Resolução datada de 2003 prevê que essas vagas só podem ser preenchidas por funcionários de carreira bacharéis em direito, escolhidos pelos juízes. No entanto, comarcas como a de Pedro Leopoldo, Santa Luzia, Patos de Minas, Nova Lima e algumas varas da capital mineira têm como chefes de cartórios pessoas que não se encaixam no perfil exigido pela resolução.
Um exemplo é o cartório de Pedro Leopoldo, chefiado pela irmã do deputado federal Márcio Reinaldo (PP), Sílvia Regina Dias Moreira. A chefe da 31ª Vara de Belo Horizonte, Munira de Freitas Bejjani, é irmã do ex-secretário-geral do TRT Samir Bejjani, hoje aposentado.
PF considera insalubre local que pegou fogo em Neves
Antes mesmo do laudo final, a Polícia Federal de Minas – responsável pela perícia para identificar as causas do incêndio na única vara do trabalho de Ribeirão das Neves –, vai indicar que o local é insalubre. Uma contradição mantida na estrutura da Justiça trabalhista de Minas, que deveria zelar pelo cumprimento das leis do setor. Cerca de 3 mil processos em tramitação no município e, sem espaço adequado, estavam espalhados por todo o primeiro andar de um pequeno prédio de três andares, onde está instalada a vara. O incêndio aconteceu na madrugada do dia 4, depois que um vidro foi quebrado e dois artefatos teriam sido atirados no interior da vara.
Esse é o quarto incidente em varas do trabalho registrado em Minas em apenas dois anos. Comarcas como Barbacena, Muriaé e Contagem também registraram ameaças a magistrados. Em Ribeirão das Neves, onde a vara ficou fechada por 10 dias, ainda não está definido o que motivou o incêndio. Ali, os processos preveem indenizações modestas, o que não justificaria um atentado. Na semana passada, a PF recolheu amostras da fiação, que teria sido trocada em recente reforma, para verificar também a possibilidade de um curto-circuito. Segundo os federais, parte da análise do material de supostos artefatos ficou prejudicada porque o local já tinha sido periciado também pela Polícia Civil. Não foi possível identificar, de acordo com os peritos, o líquido recolhido junto ao balcão, local mais atingido pelas chamas.
ORÇAMENTO – O diretor-geral do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de Minas, Luís Paulo Garcia Faleiro, disse que para a Justiça do Trabalho não existe qualquer vinculação entre os quatro casos registrados nos dois anos. Entretanto, admitiu que não existe recurso suficiente no orçamento do tribunal para oferecer a segurança adequada para todos os juízes. Com exceção do atentado na comarca de Barbacena, em 2006, que teria sido comprovado, para Faleiro, as demais não se caracterizam como tal. Em novembro passado, a juíza trabalhista Cristiana Fenelon, de Ribeirão das Neves, pediu segurança e não foi atendida. Ela, procurada novamente pelo Estado de Minas, se recusa a falar sobre o assunto, mas Faleiro suspeita que a ação pode ter sido simplesmente um ato de vandalismo, devido ao alto índice de criminalidade na cidade.
Atentado ou não, servidores da Justiça de 1ª instância convivem com o sucateamento do setor. Uma reforma administrativa, por meio da Resolução 37, de abril passado, aumentou o número de cargos de assessores nos gabinetes dos desembargadores do TRT de quatro para seis, ou seja, um aumento de 50%. Por outro lado, no quadro de funcionários das varas está previsto somente um. O texto da resolução ressalta que a reforma foi feita sem onerar o orçamento do tribunal. Para conseguir fechar as contas, foram extintos 379 cargos com denominação FC-05, 89 de FC-01 e 503 de FC-03, destinados a servidores que fazem funcionar as varas, para criação de 161 funções de assessores ou FC-06, de salário mais elevado, além de 486 FC-04 e 132 de FC-02.
LEIA A ÍNTEGRA DA REPORTAGEM DIVULGADA NA QUARTA-FEIRA, 18
NEPOTISMO
Esquema para empregar parentes no TRT
Faxineiros, copeiros e outros auxiliares de serviços gerais aprovados em concursos públicos realizados por prefeituras em todo o estado tiveram uma “promoção” de dar inveja a muita gente: graças a uma manobra do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT da 3ª Região), foram transferidos para Belo Horizonte, onde ocuparam parte dos mais altos cargos nos gabinetes de juízes e setores administrativos da Justiça trabalhista. O passaporte para um contracheque muito maior – e sem precisar enfrentar uma disputada seleção – faz parte de um mecanismo impulsionado pelo tráfico de influências que levou para os quadros do TRT 343 funcionários, dos quais 94 caracterizados como nepotismo, prática vedada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em agosto do ano passado.
A manobra levou a Justiça do Trabalho mineira para o banco dos réus – e por enquanto faz parte do grupo de condenados. O esquema foi abolido pela Justiça Federal, que determinou a demissão de todos os “servidores” – o que o TRT alega que cumpriu em parte. O presidente do tribunal, Paulo Roberto Sifuentes Costa, disse que sua administração é marcada pela total transparência e que no caso de qualquer eventual descompasso com a legislação atual serão adotadas medidas saneadoras. “A questão do concurso é coisa do passado. Agora, o TRT age no estrito cumprimento do seu regimento interno”, afirmou.
As contratações irregulares feitas pelo TRT foram questionadas em uma ação civil pública ajuizada em outubro de 2006 pela Procuradoria da República em Minas Gerais, que tramitou na 14ª Vara da Justiça Federal, em Belo Horizonte. Mas a questão não parou por aí: um recurso apresentado pela União, contra a decisão, tramita no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, em Brasília, e está à espera de um parecer de seu relator, o desembargador Cândido Ribeiro.
Os contratos, segundo a versão do Ministério Público Federal, fazem parte de convênios firmados entre o TRT e 90 prefeituras mineiras entre 2000 e 2004. Empregados em cargos de baixos salários nas administrações municipais, os funcionários foram requisitados pela Justiça do Trabalho para ocupar cadeiras em seus órgãos – em cargos de confiança e com salários muito mais altos que aqueles pagos pelos municípios. De acordo com a ação assinada pela Procuradoria da República, em muitos casos os funcionários nem mesmo prestaram concurso público para chegar às prefeituras mineiras. E mesmo assim foram transferidos para a Justiça do Trabalho.
SEM CONCURSO – Há exemplos de servidores aprovados em concursos de pequenos municípios e que foram requisitados pelo TRT antes mesmo do ato de sua nomeação para a prefeitura. Parte desses empregados cedidos engrossa uma lista de parentes de juízes, ministros do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e até mesmo apadrinhados políticos, segundo apurou o Ministério Público do Trabalho em três procedimentos. “…Usando de artifício cognominado de requisição, introduz, em seus quadros, pessoal de prefeituras longínquas, com processo de seleção duvidoso, perpetuando situações ofensivas à correta condução da coisa pública. Tais pessoas são sempre ligadas aos administradores públicos (nepotismo) e muitas vezes assumem funções de importância dentro do Judiciário trabalhista, em detrimento de pessoas concursadas”, disseram os procuradores na ação.
A Procuradoria da República se baseou em resultado de três procedimentos administrativos realizados pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em novembro de 2000, maio de 2001 e maio de 2004. Em todos eles, os promotores encontraram práticas “ofensivas ao princípio da moralidade e do concurso público” nas contratações realizadas pelo TRT. Dois casos mereceram destaque na ação: um deles envolve Rafael Oliveira Mendonça, filho do ex-presidente do TRT Antônio Miranda de Mendonça.
Aprovado em 4º lugar no concurso para auxiliar de serviços gerais da Prefeitura de Fervedouro, na Zona da Mata, ele tinha a sua admissão prevista para 19 de abril de 2000. No entanto, 15 dias antes, foi colocado à disposição do TRT. A irmã dele, Rachel Oliveira Mendonça, foi aprovada em 5º lugar para auxiliar de serviços públicos em Miradouro, também na Zona da Mata. Empossada em 2 de março, sete dias depois foi nomeada em função comissionada no tribunal trabalhista.
FGTS – Em resposta encaminhada pelo TRT ao Ministério Público em 2000, depois do primeiro procedimento administrativo, a justificativa para as contratações foi a necessidade de aumentar o quadro de pessoal frente ao “aumento das atividades desenvolvidas principalmente após extensão da competência por lei para cobrança do INSS e FGTS sobre reclamações trabalhistas”. Essa mesma justificativa foi apresentada ao juiz Evaldo de Oliveira Fernandes, responsável pela ação na 14ª Vara da Justiça Federal.
Para o magistrado não restou dúvidas que o esquema montado pelo TRT apresentou irregularidades e feriu a moralidade – um dos mandamentos mais importantes da administração pública. “Houve flagrante violação ao princípio da moralidade, pois que vários dos servidores requisitados/cedidos eram parentes ou de servidores-dirigentes do TRT/3ª Região ou de juízes/desembargadores deste tribunal, consoante bem pontuou o exordiante”, afirmou na sentença. O magistrado ainda apresentou em sua decisão uma lista de 94 servidores que deveriam ser reencaminhados “de imediato” aos municípios cedentes.
Vice diz que irregulares saíram
O vice-presidente judicial do TRT, Caio Vieira de Melo, disse ontem que não existe mais no quadro de servidores da instituição os aprovados para concursos em prefeituras e posteriormente requisitados. Vieira de Melo explicou que, dos 343, “apenas” 40 ou 50 permanecem trabalhando na Justiça do Trabalho de Belo Horizonte. “Eles permanecem porque estão em situação legal”, esclareceu. O vice-presidente afirmou ainda que a saída desses funcionários inviabilizaria, por completo, o funcionamento de algumas varas na capital. “Temos 102 dias para instruir um processo e sem pessoal esse prazo pode se estender para até três anos, prejudicando a população”, conclui.
Vieira de Melo disse ainda que os casos de nepotismo foram completamente varridos do TRT de Minas, como o do servidor Rafael Oliveira Mendonça e sua irmã Rachel Oliveira Mendonça, inclusive, com comunicação para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Para finalizar, o vice-presidente explicou que um dos entraves para a regularização total dos trabalhos no estado é a demora na aprovação da abertura de concurso para atendimento da demanda atual do tribunal.
Por sua vez, o diretor-geral do TRT, Luiz Paulo Garcia Faleiro, explicou que em setembro de 2007 foi assinado um termo de ajustamento de conduta (TAC) com a Procuradoria Regional da República, em Minas Gerais, com novas regras para a requisição de servidores para trabalhar na Justiça do Trabalho. As normas seguem artigos do regimento interno do TRT, que veda, desde 2002, a transferência para cargos em função comissionada de cônjuges, companheiros, parentes e afins de magistrados e servidores em atividade até o terceiro grau.
O regimento diz ainda que somente podem ser cedidos servidores públicos estáveis ou concursados com estágio probatório cumprido, nível de escolaridade e cargo compatíveis com a função que vierem a exercer no tribunal. Os servidores municipais somente poderão prestar serviços em órgãos com jurisdição nos limites do município cedente. Apesar disso, a informação não consta do recurso apresentado pela Advocacia-Geral da União, que tramita em Brasília.
Apadrinhados políticos comandam cartórios
O flagrante desrespeito à legislação atinge até mesmo normas criadas pelo próprio Tribunal Regional do Trabalho (TRT) – artifício que garante a apadrinhados políticos cargos de chefia de vários cartórios da Justiça de 1º instância. Datada de 2003, uma resolução do TRT prevê que as vagas devem ser ocupadas por funcionários de carreira bacharéis em direito, escolhidos pelos juízes, com quem os servidores terão contato direto. Até 2003, a norma interna era que as indicações deveriam ser feitas pelo presidente do tribunal.
Mas seis anos depois da nova regra, esse processo de substituição caminha a passos lentos. Comarcas como a de Pedro Leopoldo, Santa Luzia, Patos de Minas, Nova Lima e até mesmo varas da capital têm como chefes de cartórios pessoas que não se enquadram nas exigências da resolução. Os servidores têm salário considerável para a realidade brasileira: cerca de R$ 10 mil mensais, sem considerar benefícios adquiridos ao longo do tempo.
Segundo o site do TRT, Sílvia Regina Dias Moreira é chefe de cartório em Pedro Leopoldo e, coincidência ou não, irmã do deputado federal Márcio Reinaldo (PP). Munira de Freitas Bejjani, é chefe de cartório da 31ª Vara de Belo Horizonte. Ela é irmã do ex-secretário-geral do TRT, Samir Bejjani, hoje aposentado. Ele cuidou também, conforme a ação que tramita no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, dos interesses de sua cunhada Ana Cecília Bejjani.
De acordo com a sentença, Ana Cecília fez concurso para a prefeitura de Papagaios, Região Centro-Oeste, a 151 quilômetros de Belo Horizonte, mas foi requisitada para trabalhar no TRT, em Belo Horizonte. Seu nome consta entre os 94 servidores que deveriam ser demitidos, há dois anos, não só em razão da manobra para burlar a exigência de aprovação em concurso para o TRT, mas também pela relação de parentesco com o ex-secretário-geral.
O TRT, por meio de seu diretor geral, Luís Paulo Garcia Faleiro reconhece que a decisão do próprio tribunal não foi totalmente implementada, passados seis anos, porque “alguns desses servidores atendem as necessidades dos juízes, que são quem têm poder hoje para solicitar a substituição do servidor. Portanto, se isso não ocorre é porque ela é desnecessária”. Faleiro não informou o número de comarcas que descumprem a resolução do tribunal, mas garantiu que “são poucas”.
Segundo ele, para a substituição, é necessário o pedido do juiz e a aprovação pelo órgão especial do TRT, o que ocorre sempre que solicitado. “Não existe descumprimento da resolução, porque as regras para ocupar esse cargo – ser funcionário de carreira e bacharel em direito – só valem para as novas nomeações. A lei não retroage para prejudicar”, explicou Faleiro. E completou: “Os dois servidores estão no cargo legalmente e há muito tempo. Foram nomeados, entretanto, em outra administração”.
Reforma administrativa causa descontentamento
Não bastasse o nítido tráfico de influência política em seus quadros de servidores, uma reforma administrativa em andamento no TRT de Minas vem causando também profundo descontentamento entre juízes e funcionários. A Resolução 37, de abril passado, aumenta de quatro para seis as funções remuneradas de assessores nos gabinetes dos desembargadores, com salários de cerca de R$ 4,7 mil. O cargo FC 6, entretanto, só existe na estrutura das varas de 1ª instância naquelas comarcas que têm foro e com previsão de uma única vaga.
Para conseguir fazer as mudanças sem que isso significasse aumento de despesas, o TRT extinguiu 379 cargos de FC 05, com remuneração de R$ 3,43 mil, e criou outros 161 FC 06, que vão reforçar os gabinetes dos desembargadores. Além desses, foram extintos outros 89 cargos de FC 01, com salário de R$1,56 mil, e outros 503 de FC 03, com remuneração de R$ 2,12 mil. Uma reforma que, para os descontentes, significa na prática, uma mexida para reforçar a estrutura da Justiça de 2ª instância e a manutenção do processo de sucateamento da 1ª instância, onde é evidente a falta de estrutura para o adequado atendimento à demanda que tem sua parte mais visível no excessivo número de processos nas varas.
Atentados – E é nesse cenário que se acende a luz amarela de atenção. Somente nos últimos dois anos, quatro comarcas foram alvo de atos de vandalismo ou atentados contra juízes no interior do estado. O mais recente deles aconteceu na única vara do Trabalho de Ribeirão das Neves, na região metropolitana da capital, na madrugada do último dia 4, que foi incendiada. A vara, que funcionava no primeiro andar de um prédio de três andares, tinha cerca de 3 mil processos em tramitação. As causas ainda não estão claras, mas a primeira suspeita era de que alguém tenha quebrado o vidro e atirado dois artefatos dentro da sala. Entretanto, peritos da Polícia Federal consideram também a possibilidade de curto-circuito, e parte da fiação está sendo analisada.
A juíza Cristiana Fenelon, que preside a vara, optou pelo silêncio. Recusou-se a falar ao Estado de Minas , mas em entrevista ao site da Associação dos Magistrados do Trabalho (Amatra), ela diz que toda a fiação foi recentemente trocada e mais: que a segurança de juízes e servidores precisa ser reforçada. “Somos um anteparo da sociedade civil, principalmente depois da Constituição de 1988. O juiz muitas vezes tem que se responsabilizar, sozinho, pela efetividade de muitos direitos. Mas o Estado, nem sempre, nos oferece reais condições para tanto e o volume de processos não para de crescer.”
Em novembro, de acordo com o TRT, a juíza formalizou a contratação de um segurança para o local. Desde 2006, juízes do Trabalho de Barbacena e Muriaé, além de Contagem, foram ameaçados, de diferentes formas. Em 20 de outubro daquele ano, o fórum trabalhista foi incendiado e gerou um movimento nacional pela segurança da magistrada. Depois, em Muriaé, um bilhete ameaçador foi colocado no carro do juiz. Depois, em 30 de julho passado, em Contagem, um homem revoltado com o desfecho de seu processo pôs fogo na vara do trabalho. Apesar das ocorrências, o TRT, que admite não ter condição de oferecer segurança adequada a todos sob a alegação de aperto no orçamento, considera que os casos não passam de fatos isolados.
“Ainda não podemos falar que o que aconteceu em Ribeirão das Neves foi um atentado. Existe uma pequena chance de ser um curto-circuito. O fogo foi de pequena proporção e atingiu apenas o balcão, onde estavam algumas precatórias “, garante Faleiro. O TRT informa que ainda não fez o levantamento dos processos destruídos, mas cerca de 3,5 mil estava em tramitação naquela vara, que só voltou a funcionar na última segunda-feira.