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Lei anticorrupção é novo marco na relação entre poder público e setor privado

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A relação entre empresas e o poder público brasileiro inicia uma nova fase a partir desta quarta-feira (29/01), quando entra em vigor a Lei 12.846, mais conhecida como Lei Anticorrupção. Essa é a opinião de advogados consultados pela reportagem sobre o dispositivo sancionado em agosto de 2013, que regulamenta a responsabilização objetiva de pessoas jurídicas que se envolvam em atos ilícitos contra a administração pública, seja em âmbito nacional ou estrangeiro, sem que isso exclua a responsabilidade individual de seus dirigentes ou administradores.

A partir de agora, as empresas, fundações ou associações que tiverem, por exemplo, oferecido propinas a funcionários públicos ou participação de licitações governamentais de maneira fraudulenta, também passarão a ser responsabilizadas, administrativa e civilmente, independentemente do fato de terem tido ou não ciência das ações de seus funcionários – agora, elas deverão se preparar internamente para que essas irregularidades não ocorram.

“A nova lei segue uma tendência mundial de regulamentar o combate à corrupção. Em países como os Estados Unidos, ela existe desde 1977 [o célebre The Foreign Corrupt Practices Act], mas só começaram a ser aplicadas com mais rigor nos últimos anos. Grandes empresas foram condenadas por lá, o que contribuiu para que elas mudassem sua forma tradicional de atuar”, diz Plínio Shiguematsu, advogado do escritório Felsberg e Associados, especialista em direito societário.

Para a advogada Ana Paula Oriola de Raeffray, mestre e doutora em Relações Sociais pela PUC-SP, a diferença é que as regras eram muito esparsas anteriormente, como por exemplo as regras de financiamento públicas previstas no Código Penal. “Agora, a Lei Anticorrupção as consolida em algo muito mais forte para responsabilizar quem recebe os benefícios da corrupção. Também ajudará a colocar o Brasil em um nível internacional mais alto no combate à corrupção, que antes era frouxo e dificultava a vinda das empresas estrangeiras”, afirmou.

Resta apenas um decreto federal da CGU (Controladoria Geral da União) para detalhar a dosimetria das penas e a aplicabilidade da nova legislação, que deve ser publicado nesta quarta-feira (29/01). Os dois especialistas acreditam, no entanto, que a tendência é que ele não se afaste muito do espírito da lei, mantendo o mesmo padrão internacional.

Mais especificamente, o decreto deverá regulamentar aspectos como o rito processual, os critérios para aplicação das multas, competências dos órgãos fiscalizadores, os fatos agravantes ou atenuantes da prática ilícita e quais mecanismos corporativos de controle de irregularidades. Após isso, as controladorias de estados e municípios deverão editar suas normas locais.

Preparação

Ambos acreditam que a maior parte das empresas brasileiras não está pronta para se adaptar às novas exigências. “A maioria apenas começou a dar andamento nesse processo. Apenas as empresas que contavam com controladores estrangeiros já estavam preparadas para esse nível de comprometimento”, afirma Ana Paula, que é sócia do escritório Raeffray Brugioni Advogados. “Muitas terão de criar um código de conduta e pautar a conduta das pessoas é uma tarefa complicada”.

Shiguematsu acredita que outro efeito da lei é abrir um novo leque para aplicação de programas de compliance (adequação às leis), já que, de acordo com o artigo 7º da lei, no momento da aplicação das sanções, deverão ser levadas em conta a “existência de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica”.

“Quem já teve mais contato com programas de compliance terá mais facilidade de se adaptar. As que não passaram por isso terão grande tarefa pela frente, pois um programa bem estruturado não nascerá da noite para o dia. Além disso, a empresa terá de contar com o compromisso total da diretoria em adaptar sua estrutura e fornecer todas as informações dos casos que forem detectados [internamente]. Caso contrário, o programa não sai do papel”, alerta o advogado.

O que prevê a lei

Em relação à aplicação de multas, o que ocorreria após a condenação definitiva, os valores podem variar de 0,1% a 20% do faturamento bruto anual (considerando o ano interior da abertura do processo administrativo) das companhias envolvidas. Quando não é possível fixar a multa com base nesse critério, o valor poderá ir de R$ 6 mil a R$ 60 milhões – montante que não conta ainda a obrigação da empresa reparar integralmente o prejuízo causado aos cofres públicos.

Até a efetivação dessa lei, as instituições privadas suspeitas simplesmente demitiam os empregados denunciados em escândalos, emitiam uma declaração pública repudiando as ações e seguiam tocando os negócios.

Além disso, a decisão condenatória deverá ser divulgada em veículos de comunicação de grande circulação, dando publicidade ao fato às custas da própria condenada.

Outra penalidade prevê que o nome da empresa ainda será inscrito no Cnep (Cadastro Nacional de Empresas Punidas), criado por meio da lei, o que dividiu os entrevistados. “Confesso que não gosto da ideia. A inclusão em um cadastro pode ser mais prejudicial do que benéfico, pois a empresa já sofre com uma pena pecuniária, além do abalo de sua própria imagem”. Já Ana Paula acredita que a medida tem efeito didático, mas necessário para a eficácia da lei. “Na maior parte do mundo ocidental temos algum tipo de cadastro para empresas, seja social ou ambiental. E agora trata de um problema arraigado como o da corrupção. Claro, vai provocar suscetibilidades e forçar adaptações”, disse.

Por outro lado, a lei oferece benefícios para as empresas que admitem os ilícitos e colaboram com delações ou provas – por meio de acordos de leniência, que reduzem a multa em até dois terços.

Tipificação

A punição é administrativa, aplicada diretamente pelos governos, sem passar pelo congestionado Poder Judiciário.

São considerados atos lesivos à administração pública prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público ou a alguém a ele relacionada; financiar, custear, patrocinar ou subvencionar a prática de atos ilícitos; ocultar ou dissimular reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados e fraudar ou impedir licitações públicas e contratos.

Também estão passíveis de responsabilização as empresas que oferecerem vantagens ao responsável por licitação pública; que forem criadas de modo fraudulento ou irregular apenas para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo; que manipularem ou fraudarem o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a administração pública e dificultar a investigação ou fiscalização por órgãos, entidades ou agentes públicos e aquelas que intervirem na atuação das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do sistema financeiro nacional.

FONTE: Última Instância

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