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Ficha Limpa invalidada: indignação geral da nação

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Os brasileiros que depositaram suas esperanças de moralização da política brasileira na Lei da Ficha Limpa sofreram um duro golpe quando, em julgamento realizado no dia 23 de março, seis dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal declararam inválida a lei nas eleições passadas.

A decisão, confirmada pelo voto do recém-chegado ministro Luiz Fux, liberou políticos que são velhos conhecidos dos escândalos de corrupção dos noticiários brasileiros, como Jader Barbalho, Anthony Garotinho, José Roberto Arruda e Joaquim Roriz. Agora, eles se preparam para assumir seus mandatos nas respectivas Casas em Brasília, zombando de todo um esforço que mobilizou o país inteiro e colheu mais de 1,3 milhão de assinaturas para que a Lei fosse criada.

Pior que ver toda a luta de um povo em prol da devida punição a políticos criminosos ir por água abaixo, é conviver com a incerteza da validade da lei para as eleições de 2012, posto que sua constitucionalidade também é alvo de debates no STF. À população, resta torcer para que o próximo julgamento seja favorável e fiscalizar para que tudo seja feito dentro da maior transparência e lisura possíveis.

Leia abaixo matéria extraída da Revista Época de 24 de março a respeito do assunto, com mais detalhes sobre os aspectos que levaram os ministros do STF a essa decisão:

Eles vão mesmo liberar geral?

O Supremo devolve mandatos a candidatos fichas sujas e lança dúvidas sobre a sobrevivência da lei que prometia limpar nosso ambiente político

POR MARCELO ROCHA

Assim que soube das boas-novas, o grão-peemedebista Jader Barbalho, réu por peculato, falsidade ideológica e formação de quadrilha, cliente antigo e fiel da Justiça brasileira, caprichou nos elogios aos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Jader, justo ele, deu lição de Direito: “O Supremo repôs juridicamente o respeito à Constituição, reconhecendo a soberania popular manifestada em outubro nas urnas”. O tucano Cássio Cunha Lima, apeado do governo da Paraíba por comprar votos em sua campanha à reeleição, dirigiu seus agradecimentos a forças maiores: “Louvado seja Deus! Saberei honrar este mandato”. Jader e Cássio Cunha Lima haviam quebrado a lei.

Ambos queriam uma vaga no Senado. Ambos, porém, como cerca de outros 200 políticos, foram proibidos de disputar o cargo graças à vigência da Lei da Ficha Limpa, a qual impede a candidatura de políticos condenados por um colegiado de juízes – ou dos que tenham renunciado ao mandato para evitar um processo de cassação. Na semana passada, porém, o Supremo devolveu-lhes o direito – e, ao fazer isso, deu sinais de que pode tornar a lei ineficaz antes mesmo das próximas eleições.

Há mais políticos fichas sujas que vão se beneficiar da decisão do STF. São tantos, aliás, que nem a Justiça Eleitoral já sabe quais serão. A decisão da corte resultou de um voto do ministro Luiz Fux, recém-chegado ao Tribunal. Desde setembro do ano passado, quando começou a analisar a constitucionalidade da lei, o Supremo mostrou-se dividido. Embora tenha declarado que a lei é constitucional, metade dos ministros opinou que ela só deveria vigorar a partir de 2012. A outra metade votou para que ela valesse já no ano passado. Essa cisão se deu em virtude do preceito constitucional que proíbe mudanças na Lei Eleitoral no ano do pleito.

A Lei da Ficha Limpa foi sancionada em junho e, portanto, feriria esse princípio. Em tese. A divisão entre os ministros demonstra que a discussão não é tão simples – e envolve outros princípios constitucionais relevantes, como o da moralidade. Tanto que a Procuradoria-Geral da República era favorável à aplicação imediata da lei. O voto de Fux, contrário ao Ministério Público, encerrou esse debate.

A decisão da semana passada, porém, produziu apenas uma certeza (a devolução dos mandatos dos fichas sujas) e muitas dúvidas (a principal: a lei valerá um dia?). Persiste a insegurança jurídica sobre o alcance e a validade de outros aspectos da regra nas próximas disputas. O alerta partiu principalmente do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Ricardo Lewandowski: “A constitucionalidade da lei, relativamente a seus vários artigos, poderá ser questionada futuramente, antes das eleições de 2012”.

O Supremo ainda precisa esclarecer se quem teve alguma condenação antes de junho de 2010, data da promulgação da lei, poderá se candidatar nas eleições futuras. Na avaliação de alguns especialistas, isso fere a Constituição. “A retroatividade é inaceitável porque contraria as liberdades e garantias individuais”, diz o professor Amaury de Souza, doutor em ciência política pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT). “A lei tem de anteceder aos fatos”, afirma o ministro Gilmar Mendes, que votou contra a aplicação imediata da Ficha Limpa.

Outra pendência se refere ao princípio constitucional da presunção de inocência, segundo o qual a condenação em definitivo só ocorre depois de esgotados todos os recursos judiciais. A Lei da Ficha Limpa permite a candidatura de quem recebeu pena em decisões tomadas por um único juiz, mas considera inelegível quem sofre condenação em Tribunais. Mesmo assim, há ministros no Supremo que querem declarar a validade da lei somente se o candidato tiver sido condenado em todas as instâncias possíveis – o que, na verdade, a Constituição já prevê. Se essa visão prevalecer, a lei se tornará fatalmente inócua, em razão do sinuoso e lento transcorrer dos processos no Brasil. Na prática, nenhum político acabará declarado ficha suja. “A presunção de inocência não se aplica ao direito eleitoral”, diz o juiz Márlon Reis, um dos responsáveis pela coleta de mais de 1,3 milhão de assinaturas de apoio ao projeto de lei que deu origem à Ficha Limpa.

Não há prazo para o STF interpretar as imprecisões da lei. Espera-se que isso aconteça logo, mas tal manifestação depende da provocação de algum partido político – ou, ainda, de um órgão como a OAB. Enquanto isso não for feito, os brasileiros continuarão inseguros quanto às regras eleitorais. “A cidadania saiu desalentada porque de um lado tem a certeza de que a lei não será aplicada nas eleições de 2010, mas tem dúvidas sobre sua aplicação em 2012”, disse o ministro Ayres Britto após o julgamento.

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