A advogada Juliana Benício, que integra a assessoria jurídica do SITRAEMG, abordou o tema final – “Necessidade de democratização do Poder Judiciário” – do debate desse sábado, 27 de agosto, no auditório do SITRAEMG, compondo a mesa, ao lado dela, a filiada do Sindicato e servidora da Justiça Federal do Trabalho Luciana Tavares de Paula e o coordenador da Fenajufe Gerardo Lima.
“Para falarmos de democratização do Poder Judiciário, precisamos tratar antes de justiça de transição, que compreende uma elaboração teórica com o objetivo de superar um passado ditatorial, garantindo a superveniência e o fortalecimento de instituições democráticas, pautadas pela observância dos direitos humanos”, propôs a palestrante, explicando que esta “é uma elaboração que surge no final dos anos 1980, em decorrência de uma necessidade política de países da América Latina e da Europa oriental que saíam de um longo período de ditaduras marcadas pela supressão de direitos humanos e pela supressão da democracia”.
A formulação referente à “justiça de transição”, observou a palestrante, sustenta-se em quatro eixos: 1) garantia de reparação, material e simbólica, às vítimas da ditadura; 2) necessidade do resgate da memória do período, para busca da verdade dos fatos ocorridos; 3) punição dos violadores de direitos humanos; e 4) reforma das instituições. O Brasil, destacou, só cumpriu os dois primeiros eixos: o primeiro, no campo material, indenizando as pessoas lesadas ou torturadas, no simbólico, concedendo anistia aos torturados e torturadores; e o segundo, criando a Comissão Nacional da Verdade, que permitiu o resgate da história dos acontecimentos obscuros de 21 anos de repressão. A punição aos violadores de direitos humanos, afirmou a advogada, não foi possível porque o ordenamento jurídico do País não dá condição para punir por tais tipos de crimes. A reforma das instituições, que também continua pendente, foi o tema central da palestra da advogada do SITRAEMG – no caso, a reforma (a democratização, mais precisamente) do Judiciário.
Democratização do Judiciário
A palestrante começou criticando as indicações políticas para cargos de ministros e desembargadores dos tribunais. “Alguém aí pode me dizer quando o Senado rejeitou algum nome indicado por chefe do Executivo para ministro do Supremo?”, indagou aos servidores presentes. Como não houve resposta, respondeu ela mesma, dizendo que houve rejeições, sim, mas isso aconteceu ainda durante o governo Floriano Peixoto, que dirigiu o País no período de novembro de 1891 a novembro de 1894. Mesmo assim, em razão de os candidatos não terem preenchido o requisito de “notável saber jurídico”, e não por má conduta e desrespeito às leis. Foram cinco os nomes rejeitados à época: Barata Ribeiro, Innocêncio Galvão de Queiroz, Ewerton Quadros, Antônio Sève Navarro e Demosthenes da Silveira Lobo.
E os critérios para composição do Supremo continuam os mesmos desde a Constituição de 1824, informou Julina Benício. A partir da Constituição de 1988, o acesso à Justiça, admitiu a palestrante, não é problema, sobretudo nos estados da região Sudeste. Mas esse acesso, reclamou, não é abrangente. Citando como exemplo os servidores do próprio Judiciário, avaliou que estes estão bem distantes do acesso às decisões das administrações dos tribunais, e que o povo tem dificuldade ainda maior de se aproximar dos órgãos desse Poder.
A participação dos servidores na gestão dos tribunais, defendeu Juliana Benício, influiria muito para a definição dos gastos das instituições. Lembrando do corte orçamentário imposto pelo governo recentemente ao Judiciário, ela criticou os critérios adotados pelo TRT para a educação de gastos da Justiça do Trabalho, dispensando prestadores de serviço contratados através de parceria com a Feneis e estagiários, que ajudavam a amenizar a sobrecarga dos servidores, mas mantendo o pagamento do auxílio moradia dos magistrados. E denunciou a intenção do governo e do próprio legislativo de eleger instituições, como o Judiciário, para reduzir investimentos, como forma de contemplar interesses da iniciativa privada ao dificultar o acesso dos trabalhadores aos serviços da Justiça do Trabalho e dos próprios segurados da Previdência, na Justiça Federal, para manter o direito a uma aposentadoria digna.
Por fim, a advogada Juliana Benício conclamou os servidores presentes, junto com o SITRAEMG e outras entidades sindicais, a “pensarem” um mecanismo de gestão democrática do Judiciário. Uma das bandeiras a serem levantadas, por exemplo, seria a reivindicação de participação dos servidores e da própria sociedade, no Senado, no processo de sabatina aos cidadãos indicados pelo presidente da República para o cargo de ministro do STF e tribunais superiores, e também, nos tribunais superiores, nas decisões das administrações. Outra forma de democratização do Judiciário poderia se dar a partir da definição dos novos magistrados, exigindo-se deles uma formação mais humanitária, mais adequada ao perfil da sociedade brasileira. Os servidores poderiam lutar por participação na discussão dos orçamentos dos tribunais e em comissões e comitês, para que sejam mais democráticas e efetivamente paritárias.
Uma grande oportunidade para os servidores se inserirem nessas mobilizações, sugeriu a palestrante, seria a participação nos debates sobre “Quem controla o Judiciário?”, que vêm sendo promovidos pelo SITRAEMG. O primeiro foi realizado no dia 6 de agosto e o próximo será no dia 17 de setembro, também no hotel Normandy, em Belo Horizonte.
Debate
O espaço reservado para o debate sobre o tema revelou que a “democratização do Judiciário” é um grande anseio dos servidores. Um deles lembrou que a categoria se limita a lutar pela questão salarial, mas nunca se preocupa em reivindicar sua participação nas decisões dos tribunais. Ele criticou o fato de os tribunais serem administrados somente por magistrados, que a seu ver não estão preparados para tais funções, e defendeu que estas sejam exercidas por gestores. Uma servidora conclamou os colegas a ficarem atentos e se candidatarem quando os tribunais abrirem oportunidade para que servidores integrem comitês e grupos de trabalho para discutirem questões de interesse geral dos tribunais. Outro servidor sugeriu que os colegas também participem dos debates que os tribunais promovem, mas reforçou que a categoria deve exigir sua participação nas decisões dos tribunais para, aos poucos, ir acabando com os “feudos” de magistrados existentes.
A componente da mesa Luciana Tavares ressaltou a importância do debate iniciado pelo SITRAEMG a respeito da democratização do Judiciário, reiterando o convite para o debate de 17 de setembro, mas salientando que a categoria deve manter as fortes mobilizações junto ao Legislativo.
O outro componente da mesa, Gerardo Lima, disse que a democratização do Judiciário é um tema predileto no seu dia a dia, e lembrou que as cúpulas dos tribunais vivem pensando em argumentos que podem utilizar para indeferir pleitos da categoria. O Judiciário, observou, tem como precípua a função jurisdicional, e precisa democratizar suas administrações. “Por que não ser administrado por gestores?”, sugeriu. Ainda sobre a democratização desse poder, citou a conversa que ele e representantes do SITRAEMG e do SINPOJUFES tiveram na semana passada com a ministra Carmen Lúcia, futura presidente do STF, relatando que, na oportunidade, os visitantes reivindicaram assento dos servidores no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no Conselho da Justiça Federal (CJF), no Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), direito de voto nas eleições para presidentes dos tribunais e outras prerrogativas de acesso democrático dentro das instituições. “O assento nos conselhos é fundamental. Temos que pedir, inclusive, para termos o direito também de sermos votados, participação no planejamento estratégico dos tribunais. Temos que provocar uma mudança completa, de paradigma, no judiciário. O judiciário continua sendo uma caixa preta, inclusive para nós servidores. E nós temos que lutar pela abertura dessa caixa preta”, concluiu.
Outras entidades
Já nas considerações finais do evento, Libério, do Sindicato Nacional dos Trabalhadores do IBGE, pediu espaço para comentar que os sindicatos das diversas categorias de servidores públicos estão começando a se rearticular em mobilizações conjuntas. “Trabalhadores se juntam, constroem e transformam, Temos que ganhar as ruas, protestar e brigar para que as leis não sejam tão draconianas”, resumiu. Márcia, do Sindifes, parabenizou o SITRAEMG pela realização do seminário e destacou a importância da união das categoria. Encerrando o evento, o coordenador geral do Sindicato Alan da Costa Macedo afirmou que o objetivo do seminário foi trazer as entidades para próximo do SITRAEMG e para as lutas gerais de interesse dos servidores.
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