Conforme divulgado pelo SITRAEMG, no ato público realizado em frente ao TRT da Rua Mato Grosso, em Belo Horizonte, na última quinta-feira (14), pelo Dia Nacional de Lutas, Mobilização e Paralisação em Defesa do Serviço Público, contra a Reforma da Previdência e pela revogação da Reforma Trabalhista, os servidores presentes demonstraram ânimo novo para a luta contra os ataques do governo aos trabalhadores e ao serviço público. Não foi diferente na roda de conversa que debateu “Os efeitos da Reforma Trabalhista sobre trabalhadores e trabalhadoras”, na manhã deste sábado (16), na sede do Sindicato dos Trabalhadores em Educação da Rede Pública Municipal de Belo Horizonte (Sind-Rede/BH). Foram pouco mais de 30 participantes – servidores do Judiciário Federal e da base do Sind-Rede/BH e Serjusmig (da 1ª Instância da Justiça Estadual). Porém, revelaram avidez por discutir e reagir à pauta maldita de Temer, fielmente endossada por um Congresso Nacional constituído por maioria comprovadamente corrupta.
A roda de conversa, promovida pelo SITRAEMG, teve como expositores o auditor fiscal do trabalho Lucas Reis da Silva, o juiz do TRT-2 Jorge Luiz Souto Maior e o assessor da Corregedoria do TRT-3, Renê de Souza Torres, e como “provocadora”, a advogada Maria da Glória Ferreira Trogo, representante dos movimentos sociais. Coube ao coordenador Henrique Olegário Pacheco fazer a abertura, agradecendo ao Sind-rede/BH pela cessão do espaço, além da presença dos servidores, e ressaltando a importância da realização de eventos que debatem as políticas de retirada de direitos dos trabalhadores. Também estiveram presentes os coordenadores Célio Izidoro e Wallace Marques Coelho, além da advogada Juliana Benício, da assessoria jurídica, e do psicólogo Arthur Lobato, do Departamento de Saúde do Trabalhador e Combate ao Assédio Moral (DSTCAM). Entre os servidores presentes, José Francisco Rodrigues, do TRT, também coordenador do Núcleo Mineiro da Auditoria Cidadã da Dívida. Antes de chamar os expositores para a mesa, a advogada Maria da Glória Ferreira Trogo frisou que a reforma trabalhista aprovada pelo atual governo representa “uma mudança histórica no patamar de um retrocesso secular”.
Análise dos expositores
Primeiro expositor, o servidor do TRT-3 Renê de Souza Torres, classificando a reforma trabalhista como “uma bomba que atinge também os servidores”, lembrou que ela foi aprovada em apenas quatro meses e lamentou o fato de ver, entre os próprios colegas da Justiça do Trabalho, desconhecimento geral relação às reformas e desmotivação diante do corte de verbas que levou à redução do quadro, com demanda tão grande de serviços. Constata-se também diante desse quadro, segundo ele, a ampliação nos índices de adoecimento e de casos de suicídio. Com a reforma, opinou, visa-se encolher a Justiça do Trabalho, que caminha para acabar se transformando em mero juizado. Ele contestou o discurso do governo ao alegar uma crise econômica para justificar as reformas. Na verdade, segundo Torres, as mudança legislativas prejudiciais aos trabalhadores têm como objetivo o aumento dos lucros das empresas, no caso da reforma trabalhista, e, no caso da previdenciária, o desvio de recursos públicos para a iniciativa privada e para o pagamento da dívida pública, em prol dos banqueiros. Sobre a dívida pública, aliás, o assessor da Corregedoria do TRT lembrou que vem discutindo com o SITRAEMG a possibilidade de realizar um grande debate sobre a questão, visando fazer chegar a toda sociedade que o Brasil, apesar de ser um país de riqueza imensurável e abundância em recursos naturais, além de pacífico e praticamente imune a tragédias ambientais, vive um quadro “trágico” de escassez de recursos para os serviços essenciais à população (educação, saúde, habitação, segurança pública, justiça e outros). Tudo isso porque metade do orçamento da União é destinada todo ano ao pagamento apenas dos juros e amortizações da dívida, que não finda nunca, podendo chegar ao final deste ano, segundo a Auditoria Cidadã da Dívida, a R$ 3,4 trilhões.
Já o auditor fiscal Lucas Reis da Silva falou sobre as mudanças nas leis trabalhistas aprovadas pelo Congresso, desconstruindo o discurso do governo em defesa da reforma. A reforma trabalhista na verdade, explicou ele, já havia sido iniciada com a aprovação da lei 13.429/17, que permite a terceirização irrestrita nos serviços públicos e iniciativa privada e o trabalho temporário. A terceirização gera mais acidentes de trabalho, precariza as condições de trabalho, reduz os salários e ocasiona constantes atrasos no pagamento. Já a respeito da lei 13.467/17, da reforma trabalhista, asseverou que as mudanças representam pelo menos três séculos de retrocesso. Ao contrário do que diz o governo, não resolverão o problema do desemprego – tendência é ampliar, como aconteceu, por exemplo, no México e na Espanha– e nem modernizarão as relações de trabalho – também ao contrário disso, precarizarão cada vez mais: o contrato de trabalho intermitente obrigará o trabalhador a ficar à disposição da empresa em casa sem saber quanto irá receber; o contrato de trabalho intermitente amplia de 25 para 30 horas a jornada máxima semanal sem horas extras, mas podendo realizar até seis HE a partir da 25ª hora; a representação por local de trabalho fragiliza o posicionamento e poder de barganha dos trabalhadores; a prevalência do negociado sobre legislado, com a fragilização dos sindicatos, facilita muito mais para o empregador; o teletrabalho impõe uma jornada ilimitada de trabalho. A reforma, comentou o palestrante, chega ao ponto da mesquinhez, por exemplo, ao determinar que o trabalhador já registre o ponto devidamente uniformizado, impedindo-o de trocar de roupa depois do horário de entrada, e atribuir-lhe a obrigação pela higienização do uniforme, e fora do horário de trabalho.
O juiz Jorge Luiz Souto Maior, já conhecido por sua visão humanista, diferenciada no meio da magistratura, concordou com as colocações dos demais expositores, e destacou que eles analisaram “com propriedade” as mudanças relativas à terceirização e leis trabalhistas. Alertou, porém, que o fizeram como se as mudanças ainda virão, quando. na sua opinião, já vêm sendo implementadas há muito tempo. A terceirização, por exemplo, já é praticada há pelo menos 15 anos e atinge 12 milhões de brasileiros. Ela não é só um retrocesso, mas a intensificação de uma degradação das políticas sociais que a sociedade brasileira já vem sofrendo há anos. Quanto à reforma trabalhista, enfatizou que as mudanças significam o fim, mas podem vir a ser ainda muito piores, se não houver reação dos trabalhadores. Para ele, não é o momento de se discutir as leis que trouxeram tais mudanças. Os trabalhadores brasileiros devem parar de “fetichizar” a lógica do direito e reagir, o quanto antes, para que não haja terceirização de forma alguma e que prevaleça uma legislação trabalhista efetiva e justa. Ainda segundo o magistrado, os trabalhadores perderam o senso de classe. Passaram a se denominar apenas como “categoria” e, daqui a pouco, com a intensificação desses ataques que vêm sofrendo, vão ter que lutar individualmente. “Há uma derrota social da classe trabalhadora, que não percebe isso. Temos que reconstruir a consciência de classe”, ensinou. Os sindicatos, apontou, são o caminho para essas mudanças.
Como convencer as pessoas a irem à luta?
Como se tratava de uma roda de conversa, no debate foi dado um tempo maior do que o de costume, para as manifestações. Servidores do TRT que estavam presentes reclamaram dos estragos que o corte orçamentário, imposto pelo governo, trouxe para o Tribunal, esquecendo-se que a Justiça do Trabalho não gasta somente, mas que é também uma instituição arrecadadora. Também foi manifestado o receio de que a terceirização irrestrita gerará o apadrinhamento no serviço público; que a divulgação de escândalos de corrupção no serviço público parece até que são para “distrair” a população, para desviar a atenção das políticas de retiradas de direitos; que os próprios servidores públicos foram coniventes com a ascensão de Temer ao governo, e devem assumir esse erro, por não terem denunciado que o impeachment, na verdade, era um golpe (popularizado como “golpe parlamentar”); mas que, por outro lado, quem votou em Dilma Rousseff deve fazer um mea-culpa assumindo que também votou em Temer. Foi, ainda, pedido aos expositores que indicassem uma “saída” dessa alienação por que passa a classe trabalhadora – como atingir as pessoas?
O coordenador do SITRAEMG Henrique Olegário Pacheco defendeu a criação de uma “escola dos trabalhadores”, enquanto o coordenador Célio Izidoro disse que a realização de cursos de formação sindical poderá contribuir para a saída do imobilismo, preparando os trabalhadores para as lutas. Houve, ainda, denúncia de que os magistrados já fazem até confusão de distinção entre “direitos” e “privilégios”, citando como exemplo o pagamento do auxílio moradia para membros da Magistratura e do Ministério Público que já possuem moradia própria, e até mesmo em duplicidade para casais de membros dessas instituições.
Ampliar o debate das reformas com trabalhadores e população
Os expositores ouviram atentamente as manifestações e foram unânimes em dizer que o único caminho para reverter essa situação crescente de perda de direitos é mobilizar, debater as questões com toda a classe trabalhadora e a população. O juiz do TRT de São Paulo discordou, em parte, com a afirmação de uma servidora de que a JT contribui muito para a arrecadação. Não é mais assim, corrigiu ele. A JT vem se elitizando há muito, concedendo cada dia mais isenções para as empresas.
Depois de tantos lamentos, diante da evidenciação de tantas perdas sociais que vem sofrendo a classe trabalhadora, um alento na informação do juiz Jorge Luiz Souto Maior. Salientando que os trabalhadores não são tão alienados como andam dizendo, informou que debates como os realizados neste sábado, apesar da participação ainda pequena das pessoas, vem acontecendo, e de forma constante e crescente, em todo o Brasil. Que aqueles que participam se tornem multiplicadores da conscientização aos demais trabalhadores quanto à necessidade de intensificar a mobilização e luta, como foi dito no ato realizado na última quinta-feita, em frente ao TRT da rua Mato Grosso.