Em artigo anterior, mostramos que, contrariando todos os mitos alardeados pelo governo, a seguridade social está no azul. Mas não somente isso. A desoneração da previdência social escancara ainda mais o mito do rombo na previdência, mostrando os reais interesses que se ocultam por trás desse discurso. Nesse sentido, procuramos, em seguida, mostrar que todo este discurso do déficit na previdência visa apenas justificar a nova reforma do sistema em curso no Brasil.
De início, o que é desoneração da previdência? Simples. Trata-se de um instrumento de política econômica que tem o objetivo de retirar a contribuição patronal de 20% para a Previdência Social, substituída por uma contribuição sobre o faturamento de 1 a 2%, de acordo com o setor beneficiado. Segundo os empresários, apesar de a maior parte do custo com a previdência sair do salário dos trabalhadores, o custo patronal da Previdência era um entrave à competitividade brasileira com a China. Não sem razão: denominam a contribuição de “custo Brasil”.
Ora, as desonerações já estão em curso e aumentam ano após ano: 136%, desde a implementação do Plano Brasil Maior, que permitiu o não pagamento da contribuição patronal para diversos setores. Desde o início da implementação da nova política de desonerações pelo governo de Dilma Rousseff, em 2010, o impacto já é de mais de R$ 44 bilhões frente ao período anterior. O impacto total, por sua vez, pode ser visto no gráfico abaixo.
E esse processo continua. Dilma Rousseff já informou que pretende enviar a nova reforma da Previdência, para o Congresso Nacional, até o mês de abril. Seu ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, declarou em dezembro que irá propor a definição de uma idade mínima para a aposentadoria de 65 anos.
Baseado na mesma manipulação dos dados apresentadas nas páginas anteriores, o Governo quer insistir que o Brasil será melhor depois que criar a idade mínima para a aposentadoria, que desvincular o piso previdenciário do salário mínimo, aumentar a dificuldade de acesso aos benefícios gerais e um longo etc.
Caso seja feita esta reforma, será mais uma de várias encampadas pelos governos petistas desde que entraram no poder, em 2003. Em verdade, a primeira reforma da previdência ocorreu em 1998 no Governo FHC, quando os servidores perderam a prerrogativa de uma aposentadoria diferenciada da dos demais trabalhadores, o que permitiu a realização da segunda Reforma, que em 2003, no Governo Lula, acabou com a integralidade e a paridade. Isto significa que os novos sevidores que ingressaram a partir de 2004 passaram a ter aposentadoria pela média. Já em 2012, no Governo Dilma, foi aprovada a Previdência Complementar, e os servidores contratados após 04/02/2013 têm o teto do RGPS como aposentadoria e, se quiserem receber mais, terão que contribuir para a previdência complementar (Funpresps). Em 2015, ainda sob o governo Dilma, foi aprovada a Lei 13.183/15 que consagra a fórmula 85/95, que permite a exclusão do fator previdenciário do cálculo do valor das aposentadorias quando a pessoa atingir tal pontuação através da somatória de idade e tempo de contribuição (sendo 85 pontos para a mulher e 95 para o homem).
Como se nota, aproveitando-se de uma crise econômica, o governo rifa direitos básicos dos trabalhadores, assim como foi feito intensamente no ano passado, para agradar o “mercado”, esta entidade considerada como um “deus”. Para conquistar sua “confiança” e dar “credibilidade”, a promessa é que os direitos sociais serão jogados para debaixo do tapete, ainda sendo acusados de serem os geradores da crise.
Mas qual é o mundo ideal do “mercado” (leia-se capital financeiro) e dos governos que lhes servem? Que, assim como outros países, não exista mais uma previdência pública, e sim privada, como já vem acontecendo no Brasil desde o governo Lula.
A Previ (fundo de pensão do Banco do Brasil), o maior plano de pensão privada do país, acaba de ter um prejuízo de R$ 13 bilhões. Mas ela não está só. Os outros três principais fundos privados (dos trabalhadores dos Correios, Petrobras e da Caixa Econômica), juntos com a Previ, tiveram um déficit em 2015 que chegou a R$ 46 bilhões. E para quem sobrará a conta? Para o trabalhador, claro.
A Previdência, e a Seguridade Social como um todo, está longe de ser o problema brasileiro. Muito pelo contrário. É uma conquista que deve ser defendida com todos os esforços, pela classe trabalhadora, e serve para garantir que todos terão uma aposentadoria.
Por que não se discute o que realmente é um desperdício do dinheiro público, como o montante de juros pagos todos os anos pelo Governo? Apesar dos seguidos déficits primários, é importante lembrar que isto não quer dizer que não houve gasto com juros da dívida pública federal. Se olharmos no Relatório Resumido de Execução Orçamentária, do Tesouro Nacional, em 2015 foram pagos R$ 208,4 bilhões em juros e encargos da dívida (ou seja, sem considerar amortização ou refinanciamento), ainda mais do que os R$ 170,4 bilhões pagos em 2014. Isto é igual a 81,56% de tudo o que foi gasto com os milhões de servidores públicos e outros funcionários ligados ao governo (falo da despesa pessoal e encargos sociais), ou 75,3% do que foi transferido para os 5.561 municípios brasileiros e as 27 unidades federativas do país, ou mesmo mais de 15 vezes o que o Governo Federal classificou como investimento.
Mas querem nos convencer que o problema é a aposentadoria do trabalhador.
* ILAESE: Instituto Latino-Americano de Estudos Socioeconômicos