Nessa sexta-feira (10), a Assembleia Legislativa de Minas abriu-se mais uma vez para o debate sobre a PEC 06/2019, da Reforma da Previdência, desta vez abordando os impactos desta sobre os aposentados e trabalhadores contribuintes do INSS, os serviços públicos e os beneficiários de prestação continuada. A audiência foi organizada pela Comissão do Trabalho, da Previdência e da Assistência Social da Casa, contando com a presença, como debatedores, da economista e professora da UFRJ Denise Gentil, o economista e especialista em Previdência José Prata Araújo, a coordenadora da Frente Popular Mineira em Defesa da Previdência Social, Ilvia Lauria Franca, e o advogado Roberto de Carvalho, presidente do Instituto de Estudos Previdenciários (IEPREV) e representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Coordenaram a mesa os deputados estaduais André Quintão e Marília Campos, ambos do PT.
Os coordenadores do SITRAEMG Carlos Humberto Rodrigues, Célio Izidoro e Adriana Mesquita, além de alguns filiados, também estiveram presentes.
Ao abrir os trabalhos, a deputada Marília Campos afirmo que a PEC 6/2019 significa o verdadeiro “desmonte” da Previdência Pública e é apenas mais uma das medidas do governo que visam adequar as despesas do Estado ao teto estipulado pela Emenda Constitucional 95, que congelou os gastos públicos por 20 anos. Outra medida tomada esta semana e que causou revolta da população, sobretudo no setor da educação, foi o corte de 30% nos orçamentos das universidades federais. A parlamentar aconselhou os trabalhadores e entidades a se mobilizarem, inclusive indo para as ruas, para evitar a aprovação da reforma.
A professora da UFRJ foi a primeira a proferir palestra. Ela disse que o governo federal recorre a argumentos forjados para defender sua proposta, espalhando o terror para que a população acredite que ela é necessária. A docente destacou algumas das frases que o Executivo tem mais repetido para justificar a necessidade das mudanças na Previdência. Uma delas: se a reforma não for aprovada, a situação econômica do país vai se agravar e não vai ser possível o ajuste fiscal. Para a palestrante, se, por um lado, o governo apresenta números estapafúrdios em favor das mudanças, por outro, omite dados concretos e contundentes que mostram que, se as contas públicas estão no vermelho, é em consequência das políticas públicas equivocadas dos sucessivos governos. Exemplos citados pela palestrante: a Previdência, ao contrário do que alega o governo, é superavitária, pois, somente no período entre 2005 e 2015, foi acumulado um superávit de R$ 957 bilhões; há uma dívida acumulada de grandes corporações, principalmente as do setor financeiro, com o sistema previdenciário da ordem de R$ 427,4 bilhões; as grandes empresas, inclusive algumas dessas devedoras, foram beneficiadas, somente em 2018, com nada menos que R$ 283 bilhões em desonerações, 52% dos quais com a seguridade social e Previdência; na reta final do governo Temer, foi concedida renúncia fiscal de R$ 1 trilhão, até 2040, para as empresas petrolíferas; só em 2017, foram desvinculados do orçamento da União, para despesas discricionárias do governo, através da DRU, nada menos que R$ 100,4 bilhões. “O governo é que tem que provar para nós que não há uma alternativa menos gravosa do que a que está sendo proposta”, cobrou.
Outra frase utilizada pelo governo em favor da reforma previdenciária, segundo a professora Denise Gentil, é a de que o “nosso nó fiscal é a razão primeira para limitação do nosso crescimento econômico sustentável, e esse nó tem sua raiz na despesa previdenciária”. Ela alerta, contudo, que a Reforma Trabalhista e a lei das terceirizações foram aprovadas com o discurso de que isso seria importante para a retomada do crescimento econômico. “E por que a economia não cresce?”, questionou.
Sobre o dispositivo da PEC 6/2019 que prevê a criação do regime de capitalização, ela afirmou que, ao invés de economizar com privatização da Previdência, o país estará é criando uma dupla dívida para o futuro: uma para garantir o pagamento das aposentadorias para quem já está aposentado ou vier a se aposentar pelo atual sistema, de repartição simples, e outra para assumir as aposentadorias dos futuros segurados, em caso de “quebra” de fundos de pensão. E acentuou que, se a capitalização fosse boa para a população, como alega o governo, os trabalhadores de países que a adotaram, como o Chile, não estariam reivindicando o sistema vigente no Brasil. Existem dois lados nessa reforma, classifica a professora da UFRJ: de um lado, aqueles que defendem a ideia de que a Previdência e a seguridade social são necessárias para o amparo à população; do outro, aqueles que a defendem para atender os interesses do mercado financeiro. “Vamos reagir. Vamos lutar. Essa reforma não vai passar”, concluiu, lendo a frase da faixa do SITRAEMG estendida na parede lateral do auditório da Assembleia.
O economista José Prata Araújo recomendou às entidades e aos trabalhadores levarem o discurso contra a reforma para toda a população, explicando de forma bem simplificada e adequada os pontos de interesse de cada categoria de beneficiários da Previdência Pública. Avaliando que a proposta é integralmente prejudicial à sociedade, opinou que a população não deve aceitar nem discutir, sobretudo, a possibilidade de criação do sistema de capitalização. Ele pontuou que esse modelo é tão nocivo que o Chile, que o adotou ainda no governo Pinochet, é hoje um dos países com os mais altos índices de suicídio, em razão dos baixos valores que rebem de aposentadoria depois de décadas de contribuição para o sistema. A luta contra a reforma, analisou, é difícil, mas ele enumerou alguns fatores que se apresentam favoráveis aos trabalhadores, como o fato de Bolsonaro ter a pior avaliação da população desde Fernando Henrique Cardoso; de a maior parte da população estar contra a proposta; de Temer, que tinha grande influência sobre o Congresso, não ter conseguido aprovar a PEC 287/16; de os parlamentares da bancada ruralista grande parte de sua base entre os trabalhadores rurais; e de, em 2020, terem novas eleições. Mas a única forma de derrotar o governo, indicou, é se mobilizando nas ruas.
Ilvia Lauria Franca destacou a desconstitucionalização do sistema previdenciário e a criação do regime de capitalização como temas centrais da proposta de desmonte da Previdência. A exemplo dos outros palestrantes, ela defendeu a mobilização como única forma de conseguir derrubar a proposta do governo. O advogado Roberto de Carvalho ressaltou a insegurança jurídica como o efeito principal e de maior preocupação da PEC 6/2019, com a possibilidade da desconstitucionalização da Previdência, que dará ao governo a possibilidade de promover mudanças no sistema, futuramente, através da aprovação de lei complementar, que exige quórum bem inferior ao das PECs para aprovação no Congresso Nacional. “Vamos assinar um cheque em branco, que não sabemos para quem será”, prevê. Outro ponto bastante negativo que ele identifica na proposta é o impedimento do poder judiciário dar ganho de causa para pessoas que se sentirem lesadas em seus direitos previdenciários. Dispositivo da PEC determina que a Justiça indique a fonte de custeio para eventuais passivos que venham a ser requeridos. Ao invés da reforma, na opinião do palestrante, o governo deveria era fortalecer a Previdência. “O caminho está no fortalecimento da Previdência, na educação previdenciária e na universalização da seguridade social”, defendeu.
Debate
O coordenador do SITRAEMG Carlos Humberto Rodrigues e o filiado Gerson Appenzeller participaram da audiência pública fazendo perguntas aos palestrantes. Confira abaixo:
Carlos Humberto Rodrigues
Gerson Appenzeller
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