O Sitraemg reuniu um time de autoridades abalizadas em questões da administração pública no primeiro grande debate que promoveu sobre a Reforma Administrativa depois da apresentação da PEC 38/2025 na Câmara dos Deputados.
Com o objetivo de preparar ainda mais a categoria para a luta contra a reforma, o sindicato convidou para o Simpósio sobre a Reforma Administrativa, realizado na noite de quinta-feira, 6 de novembro, no hotel Dayrell, em Belo Horizonte, os seguintes palestrantes (entre parênteses, os subtemas abordados): Leonardo Avritzer – cientista político, escritor, pesquisador e professor universitário (“Burocracia, Reforma Administrativa, Democracia”); Deputada federal Duda Salabert (PDT/MG) – professora, ambientalista e ativista de Direitos Humanos (“Reforma Administrativa: tramitação e perspectivas”); Robson Barbosa – advogado, Doutor em Direito pela UnB, mestre em Direito pelo IDP, especialista em Direito Administrativo e sócio do escritório Cassel Ruzzarin Advogados (“Já é possível falar que a Reforma Administrativa é inconstitucional?”); Regina Coeli Moreira Camargos – Doutora em Ciência Política, Diretora de Programa da Secretaria de Gestão de Pessoas do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos – MGI (“Posição do Ministério e do Governo sobre a proposta da Reforma Administrativa no Congresso”), além da deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT).
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Também estiveram presentes os coordenadores do Sitraemg Alessandra Matias Barbosa, Marjory Pereira, David Landau, Carlos Cabeça, Nelson da Costa Santos Neto e Antônio Carlos de Andrade Filho, além da filiada e coordenadora da Fenajufe, Juliana Rick, e dos advogados Débora Oliveira, Lucas Caldeira e Stela Carmo, da assessoria jurídica do sindicato.
Participaram, ainda, representantes de entidades sindicais e associativas, como a diretora do Sintsprev-MG Júlia Maria Vieira, a diretora do SindRede-BH Bárbara Guimarães Rocha, o diretor da Aslemg Marcelo Machado, e a diretora da AssiDG-MG Vera Lúcia Junqueira.
Saudações da Diretoria
Na abertura do evento, a coordenadora Alessandra Matias Barbosa agradeceu a presença de todos e ressaltou a determinação do Sitraemg de enfrentar essa luta contra mais uma tentativa de reforma administrativa, enaltecendo, ainda, a participação de debatedores de peso no assunto.
“Reforma é está sendo proposta para tirar direitos”, alertou o coordenador Carlos Cabeça. O coordenador David Landau salientou que essa história de que as alterações pretendidas são para melhorar o serviço público não é verdade. Foi preparada pelo mercado financeiro, para ser implementada através do controle dos gestores. “O serviço público são para garantir os direitos humanos”, defendeu.
“Temos que lutar contra”, convocaram os coordenadores Marjory Pereira e Nelson da Costa Santos Neto. Para Marjory, “não é uma reforma, é um desmonte”. Para Nelson, “é o sucateamento do serviço público”.
Análises da reforma
O professor Leonardo Avritzer analisou que a proposta de reforma administrativa está sendo discutida em meio a uma onda do domínio do conservadorismo populista de direita na política brasileira. Uma onda na qual o Congresso Nacional busca desmontar uma burocracia de Estado que, desde a Constituição Federal de 1988, vem garantindo direitos nunca antes tão assegurados à população, como o acesso aos serviços de saúde e educação, à preservação do meio ambiente e outros.
Citou, também, a atuação do Poder Judiciário depois do fortalecimento da burocracia estatal. Antes da CF-88, disse, o Supremo Tribunal Federal (STF) era incapaz de revisar uma decisão do Poder Executivo, e a própria Procuradoria Geral da República, que tinha algum poder, atuava sempre favoravelmente ao governo de plantão. “A gente tem que entender que o Estado é uma instituição que usa intensivamente o trabalho dos servidores”, avaliou, em defesa da necessidade de um funcionalismo forte para proporcionar os serviços gratuitos oferecidos à população.
Sobre a Reforma Administrativa, o professor disse que a proposta tramita no Congresso Nacional fere alguns princípios basilares do serviço público, como a autonomia do servidor, ao trazer medidas que lhe tiram a segurança da estabilidade, e o estabelecimento de regras para o incentivo ao cumprimento de metas, quando se sabe que essa estratégia, muito utilizada na iniciativa privada, não se adequa à administração pública.
Desafios da luta
“O que temos que fazer?”, indagou-se a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT), propondo alguns pontos que ela considera fundamentais para a luta de enfrentamento à reforma administrativa. A parlamentar citou – entre outras, ações como a criação de uma rede de solidariedade entre as diversas categorias de servidores, dos três poderes e das três esferas da federação, com umas ajudando às outras- a participação na disputa das pautas do Parlamento; e a disputa de espaço na opinião pública, com a adoção de uma comunicação estratégica, focada somente nas pautas progressistas, “sem lacração da direita”. “Temos que envolver (nessa luta) as câmaras municipais, as assembleias legislativas e as frentes dos movimentos sociais e populares”, propôs a parlamentar.
A deputada federal Duda Salabert (PDT/MG) afirmou que a proposta da reforma é carregada de mentiras. Mentem, por exemplo, que o Brasil gasta um valor muito alto com os servidores, quando se sabe que 70% do funcionalismo recebe salários inferiores a R$ 5 mil reais, o que não corresponde nem a 5% dos supersalários do serviço público.
A parlamentar criticou os ataques ao serviço público avaliando que até o capitalismo perde com um Estado enxuto. Propôs que, em vez de buscar economia no orçamento com a redução dos serviços públicos, deve-se discutir a dívida pública brasileira. “Temos que fazer uma auditoria da dívida”, cobrou.
A deputada apontou dois desafios a serem enfrentados na luta contra a reforma. O primeiro é mostrar que a reforma não é uma luta só do funcionalismo público, mas do Brasil e da sociedade brasileira; segundo, dar continuidade à mobilização, que, na opinião dela, está no caminho certo. Ela disse acreditar que a reforma não passa este ano, mas alertou que nunca se pode descuidar. “Essa final de ano temos que mobilizar ainda mais as categorias”, sugeriu.
Posição do governo
A representante do MGI, Regina Coeli, relatou que o governo atual teve que praticamente “reconstruir” as estruturas dos ministérios, dada a situação caótica de um Estado desmontado ao longo de oito anos, durante os dois governos anteriores, dos presidentes Jair Bolsonaro e Michel Temer. Segundo ela, o ministério acreditava que o atual governo não tivesse que enfrentar nova ameaça de reforma administrativa, depois da paralisação da tramitação da PEC 32/2020. Porém, com o retorno desse tema ao debate, o governo logo procurou se inteirar do que estava sendo elaborado na Câmara dos Deputados.
A palestrante assegurou que essa não é uma pauta do MGI, destacando alguns dos muitos pontos da PEC 38/2025 que o ministério considera problemáticos da proposta, como a constitucionalização da reforma, sendo que eventuais ajustes visando reais melhorias na administração pública poderiam ser feitos por meio de medidas infraconstitucionais; o atropelo do estabelecimento de parâmetros únicos para todos os entes federados, simplesmente impondo regras, sem qualquer diálogo prévio com os estados e os municípios; e o viés “fiscalista” da reforma.
Regina Coeli lembrou que o governo tem enfrentado um desafio muito grande para passar as pautas de real interesse da população no Congresso, como a isenção do Imposto de Renda para as pessoas com renda mensal de até R$ 5 mil reais. Ela pediu o apoio dos servidores e suas entidades representativas a esse enfrentamento, e sugeriu que só a luta do funcionalismo poderá derrubar a reforma administrativa.
Inconstitucionalidade da reforma
Em breve análise histórica do serviço público no Brasil, o advogado Robson Barbosa afirmou que os primeiros sinais de organização do funcionalismo ocorreu no primeiro mandato do presidente Getúlio Vargas. Foi interrompido depois desse governo, Vargas tentou retomá-lo em seu segundo mandato, sem sucesso, e, a partir daí, foram várias “idas e vindas” nessas tentativas.
Para o advogado, a Constituição Federal de 1988 trouxe muitos avanços sociais. Porém, colocados mais como uma forma de “acalmar as massas”, depois dos 21 anos de ditadura militar em que a população se viu restringida de direitos. Em relação ao serviço público, destacou que a estabilidade do servidor, enquanto instrumento de proteção institucional da Administração Pública, deve ser compreendida como núcleo central da Constituição de 1988. Porém, embora prevista no artigo 41, ela não está expressa no rol pétreo da Carta Magna. A estabilidade está ameaçada desde a Emenda Constitucional nº 19, de 1988, que abria espaço para a regulamentação da avaliação de desempenho com aprovação de lei complementar, destacou.
Como escreveu em seu artigo “Já é possível falar que a reforma administrativa é inconstitucional?”, publicado no portal Jota (veja aqui), o advogado avalia que “o modelo de reforma administrativa em discussão no Congresso enseja graves riscos institucionais e democráticos que ultrapassam a esfera funcional do servidor público e projetam efeitos sistêmicos sobre a própria configuração do Estado brasileiro”.
Robson Barbosa explica que, “ainda que não revogue expressamente a estabilidade, é exemplo de constitucionalismo abusivo, por meio da manipulação de institutos de exceção previstos na Constituição de 1988 para minar garantias institucionais estruturantes da Administração Pública cidadã e republicana de 1988 pela substituição progressiva de quadros permanentes por agentes contratados sob regimes temporários”.
Assessoria de Comunicação
Sitraemg



