De 127 sessões deliberativas realizadas pelo Senado em 2007, 89 estiveram com a pauta trancada por medidas provisórias emanadas do Poder Executivo. Definindo isso como inadmissível, o presidente do Senado, Garibaldi Alves, abriu, nesta terça-feira (10), o Seminário 20 anos da Constituição Cidadã, promovido pelas duas Casas do Legislativo.
– Como é que se pode admitir isso? Isso é um atentado à Constituição. Setenta por cento das sessões deliberativas não foram deliberativas por causa das medidas provisórias. Mas o que importa é que, acima de diferenças partidárias, possamos defender a independência do Poder Legislativo, assegurar que o Legislativo tenha agenda própria. Já basta de tanta medida provisória. Nós temos que reaprender a votar projetos de lei – disse ele.
Criticando o excesso de detalhes que marcam os dispositivos constitucionais, Garibaldi lembrou que 62 emendas alteraram a Constituição nesses últimos 20 anos. Por isso, quando discutiu com o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia, a realização desse seminário, disse, brincando, que era preciso não festejar muito esse feito.
– Vamos comemorar os vinte anos da Constituição, mas sem confeitar demais o bolo, sem deixar de explicitar discordâncias com relação ao espírito da Constituição de 1988, uma Constituição que, se não tivesse se esmerado tanto em detalhes, talvez tivesse aberto espaço para a atuação do legislador ordinário, fortalecendo o Congresso Nacional.
O presidente do Senado recomendou que se pense cada vez mais em mudanças voltadas para a clareza e a simplificação do texto constitucional, a fim de não assoberbar o Supremo Tribunal Federal (STF) com demandas sobre sua interpretação. Ele disse que, por melhor que seja a Constituição brasileira, não se pode ter diante dela uma posição estática, de reverente imobilidade face ao que nela escreveram os constituintes. Garibaldi fez também severas críticas aos direitos garantidos e até hoje não concretizados por esse texto.
– Muitos direitos ali não chegam de verdade ao cidadão comum, como é o caso dos direitos à saúde, à educação e à segurança pública. A saúde, mesmo, é um desafio que se apresenta agora mediante a regulamentação da emenda 29 a essa mesma Constituição.
Garibaldi referiu-se ainda à lei orçamentária federal que, devendo atender às grandes opções da sociedade, tem seus recursos freqüentemente restringidos por decretos presidenciais.
– Temos um verdadeiro orçamento paralelo. São problemas de índole constitucional e tão de índole constitucional que foram parar agora no Supremo Tribunal Federal que, em decisão tomada há poucos dias, resolveu que as medidas provisórias não deveriam conter créditos extraordinários.
O presidente do Senado lembrou ainda que as medidas provisórias foram incorporadas ao texto constitucional exatamente para restringir o poder imperial do presidente que detinha o poder no regime de exceção. Em sua opinião, nesse caso, “a emenda saiu pior que o soneto”. Antes de terminar seu discurso, porém, Garibaldi disse que não queria marcar sua fala apenas pelo pessimismo, até por entender que, se há uma coisa que a Constituição de 88 legou aos brasileiros, foi a democracia.
Fonte: Agência Senado