Ombudsman reconhece parcialidade da Folha de São Paulo ao tratar de servidores públicos

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“Neste caso e de modo geral, acredito que a Folha dá pouco espaço à perspectiva dos servidores públicos nesse tipo de discussão”.

Esse é o registro feito pelo jornalista José Henrique Mariante, ombudsman do jornal Folha de São Paulo, em resposta a mensagem que lhe foi enviada, por e-mail, pelo coordenador do Sitraemg David Landau.

Landau reclamou da forma tendenciosa com que o jornal abordou o reajuste do Judiciário Federal na matéria intitulada “Reajustes para o Judiciário e Ministério Público podem custar R$ 15,7 bi até 2025”, publicada na edição de 17 de agosto.

Ombudsman é uma espécie de “advogado do leitor”. O ocupante dessa função mantém contrato com o Grupo Folha para analisar de forma crítica a linha editorial da própria Folha e de outros veículos da imprensa comercial em noticiários sobre os diversos temas. Ele apresenta essa análise em artigos publicados sempre aos domingos, nas versões impressa e online da FSP.

O jornalista admitiu também que, “embora a posição da Folha seja conhecida, isso não a exime de registrar todos os lados da questão”. E informou que as ponderações do coordenador executivo do Sitraemg foram levadas para debate com redação, em crítica interna, da Folha de São Paulo.

Distorção da realidade

Na mensagem, David Landau apontou “distorção da realidade” na abordagem da matéria, ao tratar da mesma forma os projetos de reajuste dos servidores e dos magistrados. “O destaque dado para o salário dos ministros e para o montante gasto no orçamento até 2025, mesmo que fiel com a realidade, tem intuito claro de impressionar o leitor levando-o a ter uma determinada interpretação, colocando servidores e magistrados num mesmo contexto”, pontuou.

O coordenador do Sitraemg esclareceu que o último reajuste dos servidores do Judiciário Federal ocorreu ainda em 2016. Ao longo desses seis anos, as perdas inflacionárias acumuladas no período já se aproximam dos 60%. Lamentou que a Folha não enfatizou o fato de que o reajuste de 18% proposto pelo STF está previsto para ser implementado em dois anos, e somente a partir de 2023.

“Um índice de reposição salarial de 200% poderia ser muito baixo, se implementado em 20 anos”, comparou David Landau, opinando que “deixar de dizer em qual prazo esses 18% estão previstos é dar uma notícia pela metade, ignorando informações da maior relevância”.

A matéria, assinada pela jornalista Idiana Tomazeli, foi reproduzida, como produto da agência Folhapress, em vários em portais de notícia do país, incluindo o jornal OTempo (veja aqui), de Minas Gerais, e O Antagonista, de São Paulo.

Confira aqui para ler a matéria da Folha.

Veja, abaixo, a íntegra da mensagem enviada pelo coordenador do Sitraemg ao ombudsman:

“Prezado jornalista José Henrique Mariante,

Sou assinante da Folha, defensor do jornalismo livre, e da democracia, mas não posso deixar de me indignar com a matéria da Folha, publicada hoje, “Reajustes para o Judiciário e Ministério Público podem custar R$ 15,7 bi até 2025”.

A realidade que deveria ser relatada é que há uma política de achatamento salarial que visa instituir uma remuneração, para os servidores federais, num padrão cada vez mais baixo. Há um projeto de Estado que, entre outras coisas, objetiva uma diminuição radical do padrão remuneratório dos servidores.

Não estou nem fazendo juízo de valor. Do ponto de vista dos direitos democráticos, é direito de cada um defender ou não isso. O que não vejo como correto é a distorção da realidade.

Primeira coisa que tem que ser esclarecida é que não há nenhuma relação entre a realidade vivida pelos servidores do Judiciário e a vivida pelos magistrados. São carreiras diferentes, os projetos de lei que definem o reajuste dos servidores não são os mesmos que definem o reajuste dos membros do referido poder.

No caso deste ano, os projetos de ambas as carreiras têm os mesmos índices e os mesmos prazos, mas são projetos diferentes, e essa coincidência de números entre o que é oferecido para as diferentes carreiras é inédita. Os magistrados tiveram reajustes bem mais recentes que os servidores, não há como comparar os salários e as realidades colocando todos “num mesmo saco”.

Os servidores do Judiciário obtiveram a última alteração nominal nos números de seus holerites proveniente de um reajuste advindo de lei aprovada em 2016 (há sete anos). De lá para cá, as perdas de acordo com o IPCA superam 60%. Sim, porque qualquer alteração nominal nos nossos salários depende de Projeto de Lei proposto pelo STF, aprovado pelo Legislativo e sancionado pelo Executivo.

Infelizmente, nós não temos uma lei que nos garanta atualização anual de nossos vencimentos.

O projeto agora encaminhado ao Legislativo pelo STF deveria ser melhor definido como de 0%, ao invés de 18%. Pois, se ele for aprovado, nos próximos 8 meses ficaremos com 0% de reajuste. O índice amplamente divulgado de 18% só será alcançado daqui a praticamente dois anos, em julho de 2024. A primeira parcela, de 5%, está sendo oferecida apenas para abril do ano que vem. Ou seja, ele vem apenas para repor a inflação futura, não para compensar as perdas acumuladas até agora. A única garantia que esse projeto traria, se aprovado da forma como proposto pelo STF, é de que o nosso salário real daqui a dois anos será praticamente o mesmo, achatado, que o atual.

Deve ser defendido, sempre, o direito da Folha de se posicionar como bem entender. Opiniões, interesses, todos os sujeitos têm. Porém, independente de apreciações, do ponto de vista jornalístico, o prazo (de dois anos) para implementação dessa reposição salarial não é uma informação irrelevante, secundária. Um índice de reposição salarial de 200% poderia ser muito baixo, se implementado em 20 anos.

Por outro lado, o destaque dado para o salário dos ministros e para o montante gasto no orçamento até 2025, mesmo que fiel com a realidade, tem intuito claro de impressionar o leitor levando-o a ter uma determinada interpretação, colocando servidores e magistrados num mesmo contexto. Ministros do Judiciário Federal, há algumas dezenas; servidores são centenas de milhares.

O que são 5 bilhões de reais? Para todos nós trabalhadores que lutamos para chegar ao fim do mês, são valores que distam muito da nossa realidade. Para aqueles que não tem atribuição de gestores de grandes instituições ou órgãos, é uma quantia que é difícil dimensionar em relação ao que representa para o funcionamento do Poder Judiciário. São valores, que antes de tudo, impressionam. E a dimensão sobre o que é que isso representa fica ainda mais dificultada quando se soma o impacto orçamentário de quase três anos (até 2025). 

Com verdades também é possível contar mentiras, principalmente quando há interesse em gerar uma recepção de conteúdo distorcida, buscando uma interpretação que difere com a realidade.

Bom ou ruim, a informação a ser transmitida é que os servidores vem tendo o seu salário real radicalmente diminuído. E mesmo que a hierarquização dessa ideia possa ser discutível, não cabe dúvidas que deixar de dizer em qual prazo esses 18% estão previstos é dar uma notícia pela metade, ignorando informações da maior relevância.

Confiando no papel fundamental que o senhor cumpre como ombudsman desse, que um dos mais renomados jornais do país, espero que minha crítica possa ter o devido encaminhamento.

Com minhas estimas, me despeço,

David Landau
coordenador-executivo
SITRAEMG

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