Entrevista: presidente da Ass. LA de Juízes da TJ

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Dando sequência à série de entrevistas realizadas por ocasião do “2º Seminário sobre Ampliação da Competência da Justiça do Trabalho”, promovido pela Anamatra na semana passada (15 a 17 de abril), em Belo Horizonte, o abordado de hoje é o juiz Hugo Melo, presidente da Associação Latino-Americana de Juízes do Trabalho, que esteve presente no evento.

SITRAEMG – Os servidores reclamam da grande falta de servidores diante da demanda crescente em face do aumento da competência e também dos reflexos da crise econômica. Como o senhor avalia essa situação?
Juiz Hugo Melo
– É verdade que esses dois fenômenos aumentaram a demanda da Justiça do Trabalho. Em primeiro lugar, a ampliação da competência, por razões óbvias. A Justiça do Trabalho passou a processar e julgar temas que antes não julgava. E havia, inclusive, uma demanda reprimida em relação a esses temas, que desembocaram na Justiça do Trabalho. Mas, concomitantemente, houve uma ampliação substancial do número de varas trabalhistas e, portanto, do número de servidores, em cerca de 25%. Então, nós tivemos um acréscimo de 25% dos servidores em relação à realidade que existia antes da Reforma do Judiciário e, portanto, antes da ampliação da competência. Eu não tenho dados estatísticos para contrastar com essa opinião, mas parece-me que, no exercício do dia-a-dia, o número de feitos não foi ampliado substancialmente. Exatamente porque houve uma ampliação do número de varas e uma diluição desse acréscimo de demanda por essas varas novas criadas. Mas é possível que, a curto ou médio prazo, essa situação se diferencie do que nós temos hoje com uma efetiva ampliação do número de demandas. Agora, uma coisa é certa, houve uma maior complexidade dos temas que são submetidos agora à Justiça do Trabalho. Então, se o número de feitos não aumentou, a complexidade dos feitos aumentou, e isso de fato traz um acréscimo de trabalho para os operadores, juízes e, claro, os servidores também. Tenho a perspectiva de que haja de fato uma ampliação com o acréscimo de demanda. Quando à crise econômica, claro, ela gera redução de salários e de número de postos de trabalho e isso vai gerar ações trabalhistas fatalmente. O empregado despedido vai demandar na Justiça do Trabalho. Antes disso, ele não demanda porque sabe que vai perder o emprego. Enfim, esses dois fatores ampliam e são questões preocupantes, mas não no momento imediato, e sim a curto ou a médio prazo. Temos que avaliar como isso vai se desenvolver depois.

SITRAEMG – Os Sindicatos dos servidores entendem que os chamados postos avançados diminuem a qualidade da prestação jurisdicional, pois as comunidades são atendidas por pessoas despreparadas e os juízes vão ao local poucas vezes, gerando assim um acúmulo das marcações das audiências. Qual é a sua avaliação?
Juiz Hugo Melo
– A reforma da Constituição autorizou que houvesse essa forma de descentralização e a necessidade de haver um juízo mais efetivo no que concerne alcançar as comunidades mais distantes dos grandes centros, das cidades maiores. Então, sob um ponto de vista isso é positivo, que a Justiça do Trabalho vá a determinados lugares onde ela não se encontra em face da impossibilidade de se instalar uma vara em cada município, por exemplo, do país. É melhor que a Justiça do Trabalho vá a postos avançados do que, por exemplo, ela não vá, ou esteja muito distante, que o fator distância é um impeditivo para que o trabalhador exerça o seu poder de ação. O fato de o juiz ir pouco lá é também um dado preocupante, porque um dos papéis do juiz é mesmo estar na comunidade em que ele funciona. E a qualificação dos profissionais que vão auxiliar o juiz na execução dessas atividades jurisdicionais, que seriam os servidores, isso também é um elemento preocupante. No meu estado, nós temos um modelo interessante. Pernambuco tem jurisdição sobre o arquipélago de Fernando de Noronha. E não há uma vara do trabalho em Fernando de Noronha. E como é que se faz? A cada mês, o juiz vai e leva a equipe da vara para o que seria o posto avançado (de Fernando de Noronha) e lá as atividades são desenvolvidas. No mês seguinte, ele recebe as novas reclamações, já leva as sentenças das anteriores, os oficiais de justiça praticam os atos processuais necessários… enfim, funciona muito bem, porque a própria equipe do juiz daquela vara em que ele habitualmente atua é conduzida. Talvez fosse um modelo interessante a ser seguido nas outras regiões.

SITRAEMG – Nos casos de execução de contribuições previdenciárias, o que se verifica na prática é que os procuradores da Previdência, muitas vezes, provocam o movimento da máquina judiciária, insistindo em execução contra empresas quebradas ou executadas totalmente insolventes. Como os juízes do Trabalho encaram a insistência da Previdência nesse tipo de execução infrutífera?
Juiz Hugo Melo
– Em boa medida, o procurador está cumprindo o seu dever. É dever do procurador executar, ou insistir na execução, porque a rigor é de ofício do juiz, mas isso não impede nem afasta a participação dos procuradores. E eles estão cumprindo o dever no sentido de ampliar a arrecadação. Agora, tem que haver bom senso. Há momentos em que, evidentemente, aquela execução não prossegue, não dispõe de meios para continuar. E aí esse momento tem que ser identificado, não só pelo juiz, pelos servidores, mas especialmente pelo procurador que fica solicitando medidas judiciais que não são mais possíveis, na medida em que as empresas desapareceram, os sócios são desconhecidos, não há mais patrimônio a ser executado… enfim, uma série de impedimentos. A lei das execuções prevê a possibilidade de suspensão do feito, por tempo indeterminado, até que efetivamente se encontre um caminho de dar prosseguimento à execução. Eu creio que, nesses casos, o mais racional é que isso ocorra, mas tem que haver bom senso também da parte do profissional que provoca a jurisdição. Ele tem que entender que, em dado momento, aquilo não é mais possível prosseguir E quando ele obtiver efetivamente meios ou conhecer meios que justifique o andamento da execução que os informe ao juízo. Mas, enquanto isso, parece que é contraproducente a reiteração de provocação da jurisdição no sentido de prosseguimento de uma execução que não dispõe de meios para tal.

SITRAEMG – Qual é a opinião do senhor em relação à PEC 12/2006, a chamada PEC dos Precatórios, em tramitação no Congresso Nacional?
Juiz Hugo Melo
– A questão dos precatórios é algo que incomoda o Poder Judiciário, há muitos anos, porque a sistemática instituída faz com que as entidades públicas simplesmente não paguem os seus débitos, sejam trabalhistas ou não. Os trabalhistas com maior dificuldade, porque eles tem a natureza alimentar e são urgentes. Essa PEC tem como ideia central a negociação do crédito com a administração pública, de modo que crie uma espécie de leilão. Então, se três pessoas tem crédito de mil reais, o governo ou o ente público pagaria aquele que se satisfizer com um valor menor. E aquele que quiser receber cem por cento, ninguém sabe quando vai receber. Então, a PEC cria uma espécie de leilão dos créditos que já foram reconhecidos pela Justiça, e sobre os quais não se discute e que falta simplesmente pagar. Então, as entidades representativas dos juízes são contrárias à PEC, porque ela, de alguma forma, atenta contra a própria dignidade do Poder Judiciário, e mais, contra a dignidade do credor, que vai aceitar essas condições em face de uma pressão econômica que ele sofre. Condições que, em outras circunstâncias, ele não aceitaria. Ela não parece ser nem justa nem razoável. Por isso, os juízes são contrários a sua aprovação.

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