A morosidade da justiça foi apontada como um dos principais obstáculos para que a justiça seja de fato feita, especialmente para os mais pobres; Chacina de Unaí foi citada como exemplo de impunidade devido à demora no andamento dos processos
No que depender de mobilização, o TRF de Minas tem tudo para sair do papel muito em breve. O ato público em prol da aprovação da PEC 544/2002, que prevê a criação de mais quatro tribunais regionais federais no Brasil reuniu na tarde de hoje, 20, centenas de participantes, dentre servidores públicos, juízes, parlamentares e representantes de diversas entidades – só no abaixo assinado de apoio ao novo tribunal, foram mais de 500 assinaturas.
O evento, organizado em conjunto pelo SITRAEMG, pela Assojaf-MG, OAB-MG e AJUFEMG, foi realizado em frente ao prédio I da Justiça Federal em Belo Horizonte, e atraiu grande atenção da população e da imprensa. Representantes da Câmara dos Vereadores de Belo Horizonte, do TRT-3, da ASTTTER, do Sindojus-MG (Sindicato dos oficiais de Justiça estaduais), da Procuradoria da República, da Defensoria Pública da União, da Polícia Federal e da AJUFER (Associação dos Juízes Federais da 1ª Região) também marcaram presença em apoio.
“Justiça que tarda não é Justiça”
O primeiro a se pronunciar ao público foi o presidente da AJUFEMG, juiz federal José Carlos Machado Junior, que citou a expressão “custo Brasil” para dizer que também existe um “custo Minas”, que está sendo seriamente prejudicado pela morosidade devida à sobrecarga de processos no TRF1: “Minas precisa de celeridade nos processos não só dos cidadãos, mas também nas questões tributárias e empresariais, para que mais empresas se interessem em se instalar no Estado”, afirmou. Pela frente em defesa da criação do TRF-MG da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, o deputado estadual Délio Malheiros (PV) reiterou que “este tribunal [o TRF mineiro] é muito importante para facilitar a vida de todos”.
O fim da morosidade da Justiça é um dos principais benefícios esperados quando se fala em um tribunal exclusivo para Minas Gerais. De volta ao microfone, o coordenador-geral Hebe-Del Kader frisou que este não será o último ato em prol da criação do TRF-MG. O sindicalista citou frase da ministra Carmen Lúcia Rocha, recém-empossada na presidência do Tribunal Superior Eleitoral – TSE, para falar do sofrimento daqueles que esperam 10, 15 ou mais anos pela solução de um processo: “quando a Justiça tarda e falha, todos sofrem”, parafraseou Hebe-Del.
Para a OAB-MG, representada no ato pelo seu presidente, Luis Cláudio Chaves, a interiorização da Justiça Federal, promovida pela Seção Judiciária de Minas Gerais, já é um grande passo para democratizar e dar celeridade à Justiça. “A Justiça tem que estar perto do povo”, afirmou Chaves, acrescentando que “queremos justiça para o povo de Minas, que espera reconhecimento do governo federal por meio da aprovação dessa PEC [544/2002]”.
O autor da PEC, senador Arlindo Porto, também compareceu ao ato público e teceu críticas à demora dos parlamentares em Brasília para aprovar a proposta. O senador relembrou a tramitação da PEC e disse não entender como, 11 anos depois de começar a pensar um tribunal para Minas, ele ainda não existe. “Como uma proposta dessas pode ficar engavetada por tantos anos? São muitas perguntas, mas a resposta é uma só: a criação do tribunal”, provocou Porto, que defende a continuação dos protestos para exigir o direito de uma Justiça célere para o povo.
Paralelo com Tiradentes
O ato público pela criação do TRF de Minas foi realizado em 20 de abril, véspera da data da Inconfidência Mineira, com um propósito claro: mostrar que o povo mineiro está disposto a lutar pelo direito de ter uma Justiça melhor para o estado. Conforme fala de Welington Gonçalves, presidente da Assojaf-MG, “já passou da hora de Minas ser respeitada e ter a Justiça que ela tanto se esmera em oferecer”.
Também falando ao microfone pela AJUFEMG, o juiz federal Renato Martins Prates, da 8ª Vara Federal de Belo Horizonte, traçou um paralelo entre as lutas dos inconfidentes e a disposição dos mineiros para lutarem. Prates acredita que a culpa da morosidade da Justiça não é de servidores ou desembargadores, mas sim da estrutura do tribunal, já ultrapassada para o tamanho de sua abrangência. “Não podemos parar, temos que persistir. É como Guimarães Rosa disse, ‘o que a vida quer da gente é coragem’”, disse o juiz, no fechamento de sua exposição.
Verdadeiros “heróis”
Sendo a morosidade da Justiça um dos principais problemas para a população atualmente, não poderiam faltar exemplos. Ao se pronunciar ao microfone, o juiz Ricardo Machado Rebelo, também falando pela AJUFEMG, classificou como “verdadeiros heróis” as pessoas que aguardam a tramitação de um processo por até mais que dez anos. Como exemplo, ele cita um cidadão que entrou com um processo sobre uma questão previdenciária em 1997 e só há poucas semanas, já em 2012, teve o pleito julgado. Para Rebelo, “a ‘conta’ dessa demora absurda deveria ser cobrada do Marco Maia [do PT/RS, presidente da Câmara dos Deputados], que não coloca o projeto em votação de jeito nenhum”, protestou.
Outro bom exemplo – este conhecido no Brasil inteiro – dos prejuízos ocasionados pela falta de um TRF próprio para agilizar o andamento dos processos foi dado por Carlos Calazans, superintendente do INCRA em Minas Gerais: os quatro fiscais do ministério do Trabalho assinados em Unaí, cujos acusados não foram julgados até hoje, oito anos depois. “É recurso em cima de recurso, um ‘vai e vem’ sem fim e, enquanto isso, as viúvas e os filhos [dos fiscais assassinados] seguem sem justiça”, reclamou Calazans, que também criticou a presidenta Dilma Rousseff, que, para ele, já deveria ter agido: “a voz de Minas precisa ser ouvida em Brasília, já passou da hora da presidenta tomar uma decisão política”, criticou.